26 abril 2018

ana martín puigpelat


Las mujeres barren el odio
que se acumula en los rincones.
Solía acumularse entre las patas
de las sillas,
sobre todo en la última donde se sentó el amor.
Y después de barrer,
convierten el asiento en leña
para sobrellevar
este invierno infinito.

As mulheres vasculham o ódio
que se agiganta nos cantos.
Costumava estar acumulado nos pés
das cadeiras,
sobretudo na última onde o amor se sentou.
A seguir à vassourada
transformam o assento em lenha
para superar
este inverno infinito.





23 abril 2018

reneé acosta


Tao de un perro viejo

Un perro viejo descansa en el portal
sus tiempos se anegan en el tapete felpado
junto a la puerta
las torcazas resuenan en el eco
de la tarde calurosa

si alguien pudiera vivir la tranquilidad
de su descanso

el Tao y el centro invariable
se posan en el hueco sereno
de la tarde

el perro reposa sus últimos momentos

Tao de um cão velho

Um cão velho descansa no portal
os seus tempos afogam-se no tapete felpudo
ao pé da porta
as pombas ressoam no eco
da tarde quente

se pudéssemos viver a tranquilidade
do seu descanso

o Tao e o centro invariável
instalam-se no oco sereno
da tarde

o cão repousa os seus últimos momentos


20 abril 2018

maría rosa lojo


La belleza espantosa

No responderás cuando denuncie el horror de Tu Creación ni las maldades de tu criatura predilecta, porque aparecerá la belleza.

En una cara, en un grito, en una herida, en una llaga donde viven insectos y gusanos traslúcidos.

En las matanzas de los cuerpos mudos con sus ojos abiertos al Cielo que no habla.

Sucia, rota, deforme, desvalida, desordenada, impura, desgarrada, la belleza de lo horrible me partirá el corazón para hacer un oráculo que nadie descifrará.

La belleza espantosa brotará de mi corazón partido como la palabra que Dios se niega a pronunciar.

A beleza espantosa

Não responderás quando denunciar o horror da Tua Criação nem as maldades da tua criatura predileta, porque aparecerá a beleza.

Numa cara, num grito, numa ferida, numa chaga onde vivem insetos e vermes translúcidos.

Nas matanças dos corpos mudos com seus olhos abertos ao Céu que não fala.

Suja, escangalhada, disforme, desvalida, desordenada, impura, desgarrada, a beleza do horrível partir-me-á o coração para fazer um oráculo que ninguém decifrará.

A beleza espantosa brotará do meu coração partido como a palavra que Deus se nega a pronunciar.

17 abril 2018

alexandra pagán vélez


Cuando solo puedes escribir tu pasado
sientes que no te pertenece el futuro
Qué alivio tan extraño ser tan ajena de mí misma

Quando só consegues escrever o teu passado
sentes que o futuro não te pertence
Que alívio tão estranho estar tão distante de mim própria.

14 abril 2018

juana castro


La era

Mi padre y yo dormimos
en la era, y la paja
nos es lecho de estrellas. Se sienten
las culebras cruzar toda la noche
los haces de cebada, y ratas como gatos
nos roban en el trigo. Me estremezco
y no grito, porque mi padre ronca
bebiéndose la luna, y en el aire
cantan grillos de arena.

Soalho de erva

Meu pai e eu dormimos
no campo e a palha
faz-se-nos cama de estrelas. Sentem-se
as cobras atravessar toda a noite
os feixes de cevada, e ratos e gatos
roubam-nos o trigo. Estremeço
e não grito porque o meu pai ressona
bebendo a lua e no ar
cantam grilos de areia



11 abril 2018

sandeep parmar


The Octagonal Tower

History is the love that enters us through death; its discipline is grief.’
—Anne Michaels

I

Whatever rage has come through these sealed doors,
and scalded us black and frayed, we have no name for.
We cannot explain the quiet, sleepless shift of whispers,
a procession of shrouds along our corridors,
or the diverted eyes that cloud to see a row of winter oaks outside
shocked in their dendritic fizz. And if we do know it,
it is in the blood, in this terrible synapse of sky, in the road away.
From our house we drive down through a sunken valley
where, like a crypt, it is forever the hour of the dead.

You have always worn the wheel, pushed your hands and wrists
through its axes, as though it were a shackle. Driven, hunched.
It is the same—the sting of yucca and eucalyptus, a vein of pink
bougainvillea purged in hot pulses off rooftops—a fragrant massacre—
and the same steady road you drive every time afraid to speak,
afraid to ask when I will leave you alone in that house with your wife.
I translate your favourite song in my mind: This song of mine, no one will sing.
This song of mine that I sing myself will die tomorrow with me.

An October night, 1975. A sudden rain has liquefied the earth.
Mud isn’t enough. There is a word you use that means more than mud,
it is the sound of a foot, sunken to the ankle, pulling itself out—
the awful suck of uprooting. Like a scream, it is the fear of standing
so long that you might stay and sink forever. This sound trails
behind you and your brother as you walk the fields one last time.
You will leave and not return for ten years, to marry my mother
who you’ve not yet met. Your four bare feet make an agreement
with the earth, to remember. It prints its own response in your shadows.

A torre octagonal

“A história é o amor que nos entra através da morte; a sua disciplina é a dor.”
-Anne Michaels

I

Qualquer que seja a ira que tenha passado por estas portas seladas,
e nos tenha escaldado a negro de devolvido pedaços, não temos nome para ela.
Não conseguimos explicar o silente e insone intercâmbio de sussurros,
uma procissão de mortalhas ao longo dos nossos corredores.
Ou os olhos divergentes que se enevoam para ver uma fileira de carvalhos invernais lá fora
congelados na sua dendrítica efervescência. E, se é que sabemos,
está no sangue, nesta terrível sinapse de céu, no caminho que se afasta.
A partir de nossa casa conduzimos por um vale fundido
onde, como numa cripta, é sempre hora de morte.

Sempre usaste a roda, empurrando as tuas mãos e pulsos
através dos seus eixos, como se fosse uma grilheta. Impelido, curvado.
É o mesmo – o ferrão da yuca e o eucalipto, uma nervura de rosada
buganvilia purgada em pulsos quentes dos telhados – um flagrante massacre -
e o mesmo caminho firme por onde conduzes sempre que tens medo de falar,
medo de perguntar quando te deixarei sozinho nessa casa com a tua mulher.
Traduzo a tua canção favorita na minha mente : esta minha canção que ninguém cantará.
Esta canção minha que eu canto sozinha morrerá amanhã comigo.

Uma noite de outubro, 1975. Uma chuva repentina tornou líquida a terra.
Barro não é suficiente. Há uma palavra que usas que significa mais que barro,
é o som de um pé, fundido até ao tornozelo, saindo por si mesmo -
o horrível som da fratura. Como um grito, é o medo a deter-se
tanto tempo que podias ficar ali e fundir-te para sempre. Este som arrasta-se
atrás de ti e do teu irmão enquanto caminhas pelos campos pela última vez.
Sairás e não regressarás durante dez anos para casares com a minha mãe
a quem não conheceu ainda. Os teus quatro pés descalços fazem um acordo
com a terra, para recordar. Imprime a sua própria resposta nas tuas sombras.



09 abril 2018

fabiola rinaudo


Nada me pertenece,
ni siquiera los displicentes contornos de la poesía.
Los versos me han abandonado después de mi
repudio histórico.
Me negué sistemáticamente a ceder a su necesidad
y les llené la boca de comida rápida y globos de
azúcares ligeros.
La otra noche, cuando el rocío me humedecía los ojos
tirada en el parapeto de aquella ventana que guarda
los secretos de los libros,
una mujer negra que los cantaba por un dólar me
los trajo de vuelta.

Nada me pertence,
nem sequer os displicentes contornos da poesia.
Os versos abandonaram-me depois do meu
repúdio histórico.
Neguei-me sistematicamente a ceder à sua necessidade
e enchi-lhes a boca com comida rápida e balões de
açúcares leves.
Na outra noite, quando o rossio me humedecia os olhos
debruçada no parapeito dessa janela que guarda
os segredos dos livros,
uma mulher negra que os cantava por um dólar
trouxe-mos de volta.


08 abril 2018

denise levertov


To the reader

As you read, a white bear leisurely
pees, dyeing the snow
saffron,

and as you read, many gods
lie among lianas: eyes of obsidian
are watching the generations of leaves,

and as you read
the sea is turning its dark pages,
turning
its dark pages.

Ao leitor

Enquanto lês, um urso polar placidamente
mija e tinge
a neve de açafrão;

enquanto lês, alguns deuses
recostam-se entre lianas: os seus olhos de obsidiana
estão a olhar as gerações de folhas;

enquanto lês, o mar
está a virar as suas páginas escuras
a virar
as suas páginas escuras.



05 abril 2018

sarah howe


Relativity

for Stephen Hawking


When we wake up brushed by panic in the dark
our pupils grope for the shape of things we know.

Photons loosed from slits like greyhounds at the track
reveal light’s doubleness in their cast shadows

that stripe a dimmed lab’s wall – particles no more –
and with a wave bid all certainties goodbye.

For what’s sure in a universe that dopplers
away like a siren’s midnight cry? They say

a flash seen from on and off a hurtling train
will explain why time dilates like a perfect

afternoon; predicts black holes where parallel lines
will meet, whose stark horizon even starlight,

bent in its tracks, can’t resist. If we can think
this far, might not our eyes adjust to the dark?

Relatividade

para Stephen Hawking

Ao acordar, pulsionados pelo pânico, na escuridão
as nossas pupilas aferram-se à forma das coisas conhecidas.

Os fotões soltos das suas fendas como perdigueiros olfativos
revelam a dupla natureza da luz em suas sombras contidas

que enchem de riscos um laboratório sem luz, e já não são partículas,
antes ondulam para dizer adeus a todas as certezas.

Porque, o que será certeiro num universo que faz efeito doppler
como se fosse o grito de uma sereia à meia noite? Dir-se-ia

que uma luz vista de cima ou de baixo quando se move o comboio
explica certeiramente porque o tempo de dilata como uma tarde

Perfeita : prediz buracos negros onde se entrecruzarão as linhas
retas, cujos horizontes pesados nem sequer serão conhecidos

pela luz das estrelas. Se podemos chegar a tanta abstração,
poderão os nossos olhos alguma vez habituar-se à escuridão?


02 abril 2018

mónica ojeda


[*]


El tórrido aliento de un órice despierta la montaña,
te despierta con ella y despierta a los viejos leones:


es hora de almorzar.


Todos los días en tu mente habrá un desierto sepultando la calavera de la poesía;
la llevarás contigo al exilio para defenderte de la inclemencia de tu sombra
siempre extendiéndose con movimientos de astros oscuros sobre los senderos.


Tu sombra es el reflejo más antiguo de tu cuerpo.


Pero cada mañana la calavera de la poesía pesará un poco más que ayer.


La arrastrarás hacia la cima de la montaña como una constante de vapor
nublando los sentidos de los cazadores;
una amenaza que el viento cubre de arena y que barres con tu única ala.


Sus cuencas libres empañarán tu interior
y escaparás manchando de sombra un dolor antes temido:
una fiebre que reblandece los picos y tiñe la hierba con moscardones.


A pesar del fracaso no soltarás la cabeza del misterio:
la subirás a la montaña
con el peso de su mandíbula empujándote a los cuernos en manada.

Descansarás con ella en un nido improvisado.

Retozarás con sus cuencas abiertas a la noche.

No te curará la carne, pero al día siguiente será tu casa.



[*]


O tórrido fôlego de um orix acorda a montanha,
com ela te acorda e acorda os velhos leões:

é hora de comer.

Todos os dias na tua mente haverá um deserto sepultando a caveira da poesia;
levá-la-ás contigo para o exílio para te defender da inclemência da tua sombra
estendendo-se sempre com movimentos de astros escuros sobre os caminhos.

A tua sombra é o reflexo mais antigo do teu corpo.

Mas todas as manhãs a caveira da poesia pesará um pouco mais que ontem.

Arrastá-la-ás até ao cimo da montanha como um vapor constante
enevoando os sentidos dos caçadores;
uma ameaça que o vento cobre de areia que tu varres com a tua única asa.

As suas bacias livres enevoarão o teu interior
e fugirás manchando de sombra uma dor antes temida :
uma febre que suaviza os picos e tinge a erva com varejeiras.

Apesar do fracasso não soltarás a cabeça do mistério :
levá-la-ás à montanha
com o peso da sua mandíbula empurrando-te os cornos em manada.

Descansarás com ela num ninho improvisado.

Brincarás com as suas bacias abertas à noite.

Não te curará a carne mas no dia seguinte será a tua casa.



30 março 2018

yrsa daley-ward


untitled 1

If you’re afraid to write it,
that’s a good sign.
I suppose you know you’re writing the
truth when you’re terrified.

sem título 1

Se tens medo de escrever
é bom sinal.
Suponho que sabes que escreves
a verdade quando estás aterrorizada.


27 março 2018

veronika dintinjana


Vrabec, skoz bolnišnično okno

Videl sem smrt,
kako je prisedla na posteljo in si sezula copate.
Pritisk mu je padel,
obraz je postal bel, ko je legla.
Oči prestrašene.
Odletel sem ven. Ker nisem imel
deleža pri njegovem življenju,
je bilo edino prav, da nimam deleža
pri njegovi smrti.
Čez pol ure sem se vrnil
po krušne drobtine,
ki so ostale od kosila.

Um corvo através de uma janela de hospital

Vi a morte
sentar-se ao lado dele na cama e tirar os chinelos.
A sua pressão sanguínea baixou.
o seu empalideceu enquanto ela se deitava.
Os seus olhos estavam assustados.
Voei para fora. Como eu não
tinha proximidade com ele
era justo não participar
na sua morte.
Meia hora mais tarde regressei
para buscar as migalhas de pão
que estavam sobre a comida.

24 março 2018

carina rita medina


de culo al mundo
así vine
así me quedo
y así me iré
con esa foto de mi culo
sobre el cajón
lo único que por unanimidad
se ha elogiado de mi persona
digo

de cu para o mundo
assim vim
assim fico
e assim irei
com essa foto do meu cu
sobre o caixão
a única coisa que por unanimidade
foi elogiada de mim
digo