Limón
Mamá
dijo que la abuela era la responsable de que yo usara la tinta como
aretes y de que el ponche de frutas quedara bien sin sal. Abuela me
dijo que no debía cumplir los caprichos de los hombres / que no
debía cortar su barba / podar sus pies / ni acuchillar mis sueños
por los suyos.
Dijo
que ellos no podían acuchillar mis sueños, ni mis cejas, ni nada de
mí. Mamá responsabiliza a abuela por la falta de energía y mis
ganas de cerveza. Sé que mi sazón es de lirios y líquido de mis
lagrimales, sé demasiado, me digo, -no sabes algo- dice el abuelo en
mi cabeza / mi papá lo repite y mi hermano, lo cuestiona.
Sabes
todo, le digo a mi almohada en voz baja para que sea ruido que rebote
a mis lóbulos y se quede guardado en el hipotálamo que crece cuando
no debiera crecer según la doctora que me hizo las plaquetas. Abuela
dice que las hierbas van a sanarme, que tenga calma, que acomode mi
cabeza sobre sus piernas y descanse. Me caí, abuela, me caí. Mis
rodillas están sangrando.
Ella
toma un limón y lo exprime entre la herida: duele, abuela / sé
fuerte, sanará / soy fuerte, abuela. / Estás sanando / me dice.
Abrázame. Dile a mamá que ella puede sanar también. Dile que abra
los ojos. Rociémosle limón, papá no va a enterarse. Dile, abuela.
Que no lo olvide. Que nadie va a obligarnos al silencio ni a la sopa
de hachas tampoco a la piel agrietada. Abuela dice que si vuelvo a
resbalar voy a encontrar un secreto y que si no está ahí voy a
encontrarlo entre el musgo, que abuelo intentará esconderlo pero que
yo lo encontraré.
Mamá
ya no habla, tampoco mueve los dedos, mamá está siendo estatua.
Dice que la puerta la golpea, igual que la esquina de los muebles;
sus piernas tiemblan en color morado. Mami, ¿estás bien? / Sí, mi
amor, sólo me duele el estómago / sólo me quebraron las costillas
/ sólo trae pegamento y no le digas a la abuela o va a dolerme más
/ .
¿Mami…?
Abuela dice que si te callas (shhh) ya no habrá mariposas que si
(shhh) te callas, nadie te lleva guantes para luchar. Que si te
callas (shhh) que si te callas (shhh), te mueres.
Abuela
dijo que no la olvidara.
Limão
Disse a mãe que a avó era a responsável por eu usar a tinta
como argolas e que o ponche de frutas ficasse bem sem sal. A avó
disse-me que não devia cumprir os caprichos dos homens / que não
lhes devia fazer a barba / tratar-lhes dos pés / nem esfaquear os
meus sonhos em prol dos sonhos deles.
Disse que eles não podiam esfaquear os meus sonhos, nem as minhas
sobrancelhas, nem nada de mim. A mãe responsabiliza a avó pela
minha falta de energia e os meus desejos de cerveja. Sei que a minha
comida é de lírios e líquido de lágrimas, sei demasiado, digo-me,
- alguma coisa não sabes – diz o avô na minha cabeça / o meu pai
repete e o meu irmão põe em dúvida.
Sabes tudo, digo à minha almofada em voz baixa para ser ruído
que salte aos meus lóbulos e fique guardado no hipotálamo que
cresce quando não devia crescer segundo a médica que me fez as
plaquetas. A avó disse que as ervas me irão curar, que tenha calma,
que acomode a minha cabeça nas suas pernas e descanse. Caí, avó,
caí. Os meus joelhos estão a sangrar.
Ela pega num limão e espreme-o sobre a ferida : dói, avó / sê
forte, vai curar-se / sou forte, avó / Estás a curar / diz-me.
Abraça-me. Diz à mãe que ela também se pode curar. Diz-lhe para
abrir os olhos. Deitemos-lhe limão, o pai não vai dar conta.
Diz-lhe, avó. Que não o esqueça. Que ninguém nos obrigue ao
silêncio nem à sopa de machados nem sequer à pele gretada. A avó
diz que se torno a resvalar vou encontrar um segredo e que se não
estiver ali encontrá-lo-ei entre o musgo que o avó tentará
esconder mas que eu encontrarei.
A mãe já não fala, nem sequer mexe os dedos, a mãe está
estátua. Diz que a porta lhe bate, tal como as esquinas dos móveis;
as suas pernas tremem em cor de amora. Mamã, estás bem? / Sim, meu
amor, apenas me dói o estômago / apenas me partiram as costelas /
só me põe colada e não digas isso à avó senão ainda me vai doer
mais /.
Mamã...? A avó diz que se calares (shhh) deixará de haver
borboletas, que se (shhh) te calares ninguém te levará luvas para
lutar. Que se te calares (shhh), que se te calares (shhh), morres
A avó disse para não a esquecer.