02 maio 2018

eleonora finkelstein


Me daban pena los cuerpos

Cuando tenía 16 años
visitaba los cementerios.
No recuerdo por qué,
quizás por extrañeza.
Después fue más de cerca:
iba a velorios ajenos
a conocer a los muertos.
Pensaba: me dan pena los cuerpos.
Y miraba al pobre hombre a la cara.
Y lloraba con sinceridad
frente al desconocido.

Sabía que me miraban.
La viuda o el viudo, los hijos.
¿Quién sería yo, tan apenada?
No faltaba el que me ofrecía un vaso de agua
o me alcanzaba una silla.
No sabían que era solo incomprensión.
Auténtico dolor,
pena del cuerpo. De ellos, de nosotros.

Trataba con todas mis fuerzas
de ver, de escuchar, de entender.
—¿Estaba loca?—
Alguien me hablaba en voz muy baja
pero nunca supe quién, por qué, ni qué decía.

Tinha pena dos corpos

Quando tinha 16 anos
visitava os cemitérios.
Não me lembro do porquê,
talvez por estranheza.
Depois fui para mais perto:
ia a velórios alheios
conhecer os mortos.
Pensava : tenho pena dos corpos
E olhava para a cara do pobre homem.
E chorava com sinceridade
diante do desconhecido.

Sabia que me observavam.
A viúva ou o viúvo, os filhos,
Quem seria eu, tão lutuosa?
Não faltava quem me oferecesse um copo de água
ou me trouxesse uma cadeira
Não sabia que se tratava apenas de incompreensão
Autêntica dor,
pena do corpo. Deles, de nós.

Tentava com todas as minhas forças
ver, escutar, entender.
- Estaria louca? .
Alguém falava comigo com voz muito baixa
mas nunca soube quem, o porquê, nem o que dizia.


29 abril 2018

maria victoria dentice


Nostalgia

La muerte atraviesa con manos a la que fui.
La sangre me lleva sin manos la juventud perdida
La muerta atraviesa en lenguajes a la que fui,
Ya no le alcanzan sus manos para suicidarme esta noche.
Yo hablo con palabras que conocen la muerte.
Yo hablo de mí y de la muerte llevándome en un carro de oro.

Nostalgia

A morte cruza com as mãos quem fui.
O sangue leva-me sem mãos a juventude perdida
A morta atravessa em linguagens quem fui,
Já não atingiam as suas mãos para me suicidar esta noite.
Falo com palavras que conhecem a morte.
Falo de mim e da morte levando-me num carro de oiro.


26 abril 2018

ana martín puigpelat


Las mujeres barren el odio
que se acumula en los rincones.
Solía acumularse entre las patas
de las sillas,
sobre todo en la última donde se sentó el amor.
Y después de barrer,
convierten el asiento en leña
para sobrellevar
este invierno infinito.

As mulheres vasculham o ódio
que se agiganta nos cantos.
Costumava estar acumulado nos pés
das cadeiras,
sobretudo na última onde o amor se sentou.
A seguir à vassourada
transformam o assento em lenha
para superar
este inverno infinito.





23 abril 2018

reneé acosta


Tao de un perro viejo

Un perro viejo descansa en el portal
sus tiempos se anegan en el tapete felpado
junto a la puerta
las torcazas resuenan en el eco
de la tarde calurosa

si alguien pudiera vivir la tranquilidad
de su descanso

el Tao y el centro invariable
se posan en el hueco sereno
de la tarde

el perro reposa sus últimos momentos

Tao de um cão velho

Um cão velho descansa no portal
os seus tempos afogam-se no tapete felpudo
ao pé da porta
as pombas ressoam no eco
da tarde quente

se pudéssemos viver a tranquilidade
do seu descanso

o Tao e o centro invariável
instalam-se no oco sereno
da tarde

o cão repousa os seus últimos momentos


20 abril 2018

maría rosa lojo


La belleza espantosa

No responderás cuando denuncie el horror de Tu Creación ni las maldades de tu criatura predilecta, porque aparecerá la belleza.

En una cara, en un grito, en una herida, en una llaga donde viven insectos y gusanos traslúcidos.

En las matanzas de los cuerpos mudos con sus ojos abiertos al Cielo que no habla.

Sucia, rota, deforme, desvalida, desordenada, impura, desgarrada, la belleza de lo horrible me partirá el corazón para hacer un oráculo que nadie descifrará.

La belleza espantosa brotará de mi corazón partido como la palabra que Dios se niega a pronunciar.

A beleza espantosa

Não responderás quando denunciar o horror da Tua Criação nem as maldades da tua criatura predileta, porque aparecerá a beleza.

Numa cara, num grito, numa ferida, numa chaga onde vivem insetos e vermes translúcidos.

Nas matanças dos corpos mudos com seus olhos abertos ao Céu que não fala.

Suja, escangalhada, disforme, desvalida, desordenada, impura, desgarrada, a beleza do horrível partir-me-á o coração para fazer um oráculo que ninguém decifrará.

A beleza espantosa brotará do meu coração partido como a palavra que Deus se nega a pronunciar.

17 abril 2018

alexandra pagán vélez


Cuando solo puedes escribir tu pasado
sientes que no te pertenece el futuro
Qué alivio tan extraño ser tan ajena de mí misma

Quando só consegues escrever o teu passado
sentes que o futuro não te pertence
Que alívio tão estranho estar tão distante de mim própria.

14 abril 2018

juana castro


La era

Mi padre y yo dormimos
en la era, y la paja
nos es lecho de estrellas. Se sienten
las culebras cruzar toda la noche
los haces de cebada, y ratas como gatos
nos roban en el trigo. Me estremezco
y no grito, porque mi padre ronca
bebiéndose la luna, y en el aire
cantan grillos de arena.

Soalho de erva

Meu pai e eu dormimos
no campo e a palha
faz-se-nos cama de estrelas. Sentem-se
as cobras atravessar toda a noite
os feixes de cevada, e ratos e gatos
roubam-nos o trigo. Estremeço
e não grito porque o meu pai ressona
bebendo a lua e no ar
cantam grilos de areia



11 abril 2018

sandeep parmar


The Octagonal Tower

History is the love that enters us through death; its discipline is grief.’
—Anne Michaels

I

Whatever rage has come through these sealed doors,
and scalded us black and frayed, we have no name for.
We cannot explain the quiet, sleepless shift of whispers,
a procession of shrouds along our corridors,
or the diverted eyes that cloud to see a row of winter oaks outside
shocked in their dendritic fizz. And if we do know it,
it is in the blood, in this terrible synapse of sky, in the road away.
From our house we drive down through a sunken valley
where, like a crypt, it is forever the hour of the dead.

You have always worn the wheel, pushed your hands and wrists
through its axes, as though it were a shackle. Driven, hunched.
It is the same—the sting of yucca and eucalyptus, a vein of pink
bougainvillea purged in hot pulses off rooftops—a fragrant massacre—
and the same steady road you drive every time afraid to speak,
afraid to ask when I will leave you alone in that house with your wife.
I translate your favourite song in my mind: This song of mine, no one will sing.
This song of mine that I sing myself will die tomorrow with me.

An October night, 1975. A sudden rain has liquefied the earth.
Mud isn’t enough. There is a word you use that means more than mud,
it is the sound of a foot, sunken to the ankle, pulling itself out—
the awful suck of uprooting. Like a scream, it is the fear of standing
so long that you might stay and sink forever. This sound trails
behind you and your brother as you walk the fields one last time.
You will leave and not return for ten years, to marry my mother
who you’ve not yet met. Your four bare feet make an agreement
with the earth, to remember. It prints its own response in your shadows.

A torre octagonal

“A história é o amor que nos entra através da morte; a sua disciplina é a dor.”
-Anne Michaels

I

Qualquer que seja a ira que tenha passado por estas portas seladas,
e nos tenha escaldado a negro de devolvido pedaços, não temos nome para ela.
Não conseguimos explicar o silente e insone intercâmbio de sussurros,
uma procissão de mortalhas ao longo dos nossos corredores.
Ou os olhos divergentes que se enevoam para ver uma fileira de carvalhos invernais lá fora
congelados na sua dendrítica efervescência. E, se é que sabemos,
está no sangue, nesta terrível sinapse de céu, no caminho que se afasta.
A partir de nossa casa conduzimos por um vale fundido
onde, como numa cripta, é sempre hora de morte.

Sempre usaste a roda, empurrando as tuas mãos e pulsos
através dos seus eixos, como se fosse uma grilheta. Impelido, curvado.
É o mesmo – o ferrão da yuca e o eucalipto, uma nervura de rosada
buganvilia purgada em pulsos quentes dos telhados – um flagrante massacre -
e o mesmo caminho firme por onde conduzes sempre que tens medo de falar,
medo de perguntar quando te deixarei sozinho nessa casa com a tua mulher.
Traduzo a tua canção favorita na minha mente : esta minha canção que ninguém cantará.
Esta canção minha que eu canto sozinha morrerá amanhã comigo.

Uma noite de outubro, 1975. Uma chuva repentina tornou líquida a terra.
Barro não é suficiente. Há uma palavra que usas que significa mais que barro,
é o som de um pé, fundido até ao tornozelo, saindo por si mesmo -
o horrível som da fratura. Como um grito, é o medo a deter-se
tanto tempo que podias ficar ali e fundir-te para sempre. Este som arrasta-se
atrás de ti e do teu irmão enquanto caminhas pelos campos pela última vez.
Sairás e não regressarás durante dez anos para casares com a minha mãe
a quem não conheceu ainda. Os teus quatro pés descalços fazem um acordo
com a terra, para recordar. Imprime a sua própria resposta nas tuas sombras.



09 abril 2018

fabiola rinaudo


Nada me pertenece,
ni siquiera los displicentes contornos de la poesía.
Los versos me han abandonado después de mi
repudio histórico.
Me negué sistemáticamente a ceder a su necesidad
y les llené la boca de comida rápida y globos de
azúcares ligeros.
La otra noche, cuando el rocío me humedecía los ojos
tirada en el parapeto de aquella ventana que guarda
los secretos de los libros,
una mujer negra que los cantaba por un dólar me
los trajo de vuelta.

Nada me pertence,
nem sequer os displicentes contornos da poesia.
Os versos abandonaram-me depois do meu
repúdio histórico.
Neguei-me sistematicamente a ceder à sua necessidade
e enchi-lhes a boca com comida rápida e balões de
açúcares leves.
Na outra noite, quando o rossio me humedecia os olhos
debruçada no parapeito dessa janela que guarda
os segredos dos livros,
uma mulher negra que os cantava por um dólar
trouxe-mos de volta.