11 março 2022

ingrid de kok

 

Our Sharpeville

 

I was playing hopscotch on the slate

when miners reared past in lorries,

their arms raised, signals at a crossing,

their chanting foreign and familiar,

like the call and answer of rad gangs

across the veld, building hot arteries

from the heart of the Transvaal mine.

 

I ran to the gate to watch them pass.

And it seemed like a great caravan

moving across the desert to an oasis

I remembered from my Sunday School book:

olive trees, a deep jade pool,

men resting in clusters after a long journey,

the danger of the mission still around them,

and night falling, its silver stars just like the ones

you got for remembering your Bible texts.

 

Then my grandmother called from behind the front door,

her voice a stiff broom over the steps:

“Come inside; they do things to little girls.”

 

For it was noon, and there was no jade pool.

Instead, a pool of blood that already had a living name

and grew like a shadow as the day lengthened.

The dead, buried in voices that reached even my gate,

the chanting men on the ambushed trucks,

these were not heroes in my town

but maulers of children,

doing things that had to remain nameless.

And our Sharpeville was this fearful thing

that might tempt us across the wellswept streets.

 

If I had turned I would have seen

brocade curtains drawn tightly across sheer net ones,

known there were eyes behind both,

heard the dogs pacing in the locked yard next door.

But, walking backwards, all I felt was shame,

at being a girl, at having been found at the gate,

at having heard my grandmother lie

and my fear her lie might be true.

Walking backwards, called back,

I returned to the closed rooms, home.

 

 

A nossa Sharpeville

 

Brincava  à macaca sobre o quadro

quando os mineiros passaram em caminões, iam de pé,

os seus braços levantados, sinais num cruzamento,

o seu canto estrangeiro e familiar,

como a chamada e resposta de gangues radicais

através da savana, construindo artérias quentes

do coração da mina Transvaal.

 

Corri para a cancela para os ver passar.

E parecia uma grande caravana

movendo-se através do deserto para um oásis

que recordava do meu livro da Escola Dominical:

oliveiras, uma profunda piscina de jade,

homens descansando em grupo após uma longa viagem,

o perigo da missão ainda sobre eles pairando,

e a noite caindo, as suas estrelas de prata precisamente como aquelas

que conseguiste por te lembrares dos teus textos da Bíblia.

 

Então a minha avó chamou-me detrás da porta principal,

a sua voz era uma dura vassoura sobre os degraus:

"Cá para dentro, eles fazem coisas às miúdas".

 
Era meio-dia e não havia piscina de jade.

Em vez disso, uma piscina de sangue que já tinha um nome vivo

e cresceu como uma sombra enquanto o dia se estendia.

Os mortos, enterrados em vozes que chegavam à minha porta,

os homens cantando nos caminões emboscados,

estes não eram heróis na minha cidade

mas embusteiros de crianças,

fazendo coisas que deviam permanecer sem nome.

E a nossa  Sharpeville era esta coisa temerosa

que nos poderia seduzir através das bem varridas ruas.

 

Se me tivesse virado teria visto

cortinas de brocado corridas firmemente através de outras de rede,

sabia que havia olhos atrás de ambas,

ouvidos para os cães a passear no pátio fechado ao lado.

Mas, andando para trás, tudo o que senti foi vergonha,

por ser uma menina, por ter sido encontrada na cancela,

por ouvir a minha avó mentir

e o meu medo de que a sua mentira fosse verdadeira.

Andando para trás, sendo chamada de volta,

Voltei para os quartos fechados, para casa.


10 março 2022

ulla hahn

 

Mein vater


Wer ist das?

fragen meine Freunde

und deuten auf das Foto

des Mannes über meinem Schreibtisch

zwischen Salvador Allende

und Angela Davis.

 

Ich sage:

Mein Vater. Tot.

Dann fragt niemand weiter.

 

Wer ist das?

frage ich den Mann,

der nicht einmal

für das Paßfoto lächelt,

der an mir vorbeischaut

wie beim Grüßen

an Menschen,

die er nicht mochte.

 

Bauernkind, eines von Zwölf,

und mit elf von der Schule;

hatte ausgelernt,

mit geducktem Kopf nach

oben zu sehen.

Ist krumm geworden

als Arbeiter an der Maschine

und als Soldat

verführt gegen die Roten.

 

Nachher noch einmal:

geglaubt, nicht begriffen.

Aber weitergemacht.

Als Arbeiter an der Maschine

als Vater in der Familie

und sonntags in die Kirche

wegen der Frau

und der Leute im Dorf

 

Den hab ich gehaßt.

 

Abends, wenn er aus der Fabrik

nach Hause kam,

schrie ich ihm entgegen

Vokabeln, Latein, Englisch.

Am Tisch bei Professors,

als mir der Tee

aus zitternden Händen

auf die Knie tropfte,

hab ich Witze gestammelt

über Tatzen,

die nach Maschinenöl stinken.

 

Hab das Glauben verlernt mit Mühe.

Hab begreifen gelernt und begriffen:

 

Den will ich lieben

bis in den Tod

all derer,

die schuld sind

an seinem Leben

und meinem Haß.

 

Manchmal,

da lag schon die Decke

auf seinen Knien

im Rollstuhl,

nahm er meine Hand,

hat sie abgemessen

mit Fingern und Blicken

und mich gefragt,

wie ich sie damit machen will,

die neue Welt.

 

Mit Dir,

hab ich gesagt

und meine Faust

geballt in der seinen.

 

Da machten wir die Zeit

zu der unseren,

als ich ein Sechstel

der Erde ihm

rot auf den Tisch hinzählte

und er es stückweis

und bedächtig

für bare Münze

und für sich nahm.

 

Wer ist das?

fragen meine Freunde

und ich sage:

Einer von uns.

Nur der Fotograf

hat vergessen,

daß er mich anschaut

und lacht.

 

 

O meu pai

 

Quem é este?

perguntam os meus amigos

apontando para a foto

do homem no meu escritório,

colocada entre Salvador Allende e Angela Davis.

 

Eu respondo:

O meu pai. Morto.

E ninguém volta a perguntar.

 

Quem és?

Pergunto a esse homem

que nunca sorri

nem sequer na foto do passaporte

e me olha por cima dos ombros

como se cumprimentasse um estranho.

 

Filho de camponeses, um de doze,

aos onze deixou a escola;

onde tinha aprendido,

a olhar para cima

com a cabeça baixa,

curvado,

como um trabalhador sobre uma máquina

ou um soldado

forçado a lutar contra os Vermelhos.

 

Depois de tudo foi outro tempo:

Pensava que não o compreendia.

Mas continua

Como um operário na máquina

como um pai de família

e o domingo na igreja

graças à sua esposa

e às pessoas da aldeia.

 

Eu odiava-o.

 

E pelas tardes,

quando voltava para casa da fábrica

gritava-lhe na cara

palavras em latim e em inglês.

Na mesa dos meus professores,

enquanto o chá caía das minhas mãos trémulas

sobre os meus joelhos

fazia piadas sobre as patas

que cheiravam a óleo das máquinas.

 

Foi difícil mudar de ideias.

Foi difícil entender

 

que queria amá-lo

até à morte

de todos os culpados

da sua vida

e do meu ódio.

 

Às vezes

o cobertor já estava

em cima dos seus joelhos

na cadeira de rodas,

pegava na minha mão

e media-a com os seus dedos e o seu olhar,

depois perguntava-me,

como quero fazer

um mundo novo.

 

Contigo,

Disse

Com o meu punho

recolhido no seu

 

Depois fazíamos do tempo uma coisa nossa

e contava-lhe  como uma sexta parte

do mundo já era vermelha

e ele valorizava

cada parte uma por uma

metodicamente.

 

Quem é esse?

Perguntavam os meus amigos

e eu digo:

um de nós.

só o fotógrafo

se esqueceu que ele olha para mim e sorri.


09 março 2022

lesya ukrayinka

 

Contra spem spero


Гетьте, думи, ви хмари осінні!

То ж тепера весна золота!

Чи то так у жалю, в голосінні

Проминуть молодії літа?


Ні, я хочу крізь сльози сміятись,

Серед лиха співати пісні,

Без надії таки сподіватись,

Жити хочу! Геть, думи сумні!


Я на вбогім сумнім перелозі

Буду сіять барвисті квітки,

Буду сіять квітки на морозі,

Буду лить на них сльози гіркі.


І від сліз тих гарячих розтане

Та кора льодовая, міцна,

Може, квіти зійдуть — і настане

Ще й для мене весела весна.


Я на гору круту крем'яную

Буду камінь важкий підіймать

І, несучи вагу ту страшную,

Буду пісню веселу співать.


В довгу, темную нічку невидну

Не стулю ні на хвильку очей —

Все шукатиму зірку провідну,

Ясну владарку темних ночей.


Так! я буду крізь сльози сміятись,

Серед лиха співати пісні,

Без надії таки сподіватись,

Буду жити! Геть, думи сумні!




Contra spem spero


Parem os dolentes pensares!

Tudo à volta é primaveril inquietação!

E entre tantos acerbos pesares

Irá a minha juventude passar ao lado do coração?


Não, quero rir entre lágrimas,

Ludibriar as minhas torturas, cantar,

Esperar no meu cruel desespero,

E viver! Aflição, cala-te!


Num ermo, distante e sombrio,

Belas flores de abril plantarei.

Plantarei florzinhas no frio,

Com meu pranto o seu pé regarei.


E estas lágrimas, acres, fogosas,

Abrandando do gelo o rigor,

Talvez consigam que brotem as rosas

E que a minha alma renasça para o amor.


A uma montanha rochosa abrupta,

Um pedregulho grande subirei,

E, levando essa carga horrorosa,

Uma alegre canção cantarei.


Nas noites escuras, tremendo,

Não fecho os olhos cansados,

Para ver essa estrela radiante,

Senhora de sombras e fados.


Sim! Quero rir entre lágrimas,

Ludibriar as minhas torturas, cantar,

Esperar no meu cruel desespero,

Viverei! Aflição, cala-te!





08 março 2022

yaroslabi bañuelos

 

Jardines fantasmales

Aquí siempre es el mes de los lobos. La noche cruje en la garganta de un ave insomne. Mi cuerpo palpita como magnolia oscura, como un loto abierto donde sucumben las mariposas. Aquí no florece el sol en los tejados, aunque el fuego devore cada árbol moribundo. Aquí no llueven madreselvas. Los girasoles se camuflan con la falsa neblina. La hiedra persigue indicios de tormenta: se enreda en las púas del cielo, oprime la penumbra, sofoca las plegarias que murmura la tierra.

Yo soy una flor insaciable de libélulas y lluvia, hierba macerada por el desierto, una polilla atrapada en la telaraña de los días. Aquí la luz incendia los bordes del viento. El turpial no anida más bajo esta lengua seca. Aquí jamás reverdecen las palabras, no germina el verso atorado entre los dientes. Los espectros susurran una turbia bandada de poemas. Y la lechuza canta el himno de los pájaros desahuciados.


 

Jardins fantasmáticos

Aqui é sempre o mês dos lobos. A noite crepita na garganta de um pássaro insone. Meu corpo palpita como magnólia escura, como um lótus aberto onde sucumbem as borboletas. Aqui não floresce o sol nos telhados, embora o fogo devore cada árvore moribunda. Aqui não chovem madressilvas. Os girassóis camuflam-se com a falsa neblina. A hera persegue indícios de tormenta: enreda-se nas farpas do céu, oprime a penumbra, sufoca as preces que a terra murmura.

Sou uma flor insaciável de libélulas e chuva, erva macerada pelo deserto, uma traça encurralada na teia dos dias. Aqui a luz incendeia as bordas do vento. O turpial já não aninha debaixo desta língua seca. Aqui nunca reverdecem as palavras, não germina o verso encravado entre os dentes. Os espectros sussurram um turvo bando de poemas. E a coruja canta o hino dos pássaros despejados.