06 julho 2020

laura riding


The world and I

This is not exactly what I mean
Any more than the sun is the sun.
But how to mean more closely
If the sun shines but approximately?
What a world of awkwardness!
What hostile implements of sense!
Perhaps this is as close a meaning
As perhaps becomes such knowing.
Else I think the world and I
Must live together as strangers and die—
A sour love, each doubtful whether
Was ever a thing to love the other.
No, better for both to be nearly sure
Each of each—exactly where
Exactly I and exactly the world
Fail to meet by a moment, and a word.


O mundo e eu

Isto não é exatamente o que quero dizer
Nada mais do que o sol é sol.
Mas como dizer mais estreitamente
Se o sol brilha mas aproximadamente?
Que mundo de constrangimentos!
Que hostis implementos de sentido!
Talvez seja esse o significado mais próximo
Tal como talvez se forma tal conhecimento
Mais penso que o mundo e eu
Temos de viver juntos como estranhos e morrer –
Um amor amargo se
Alguma vez foi uma coisa para amar o outro
Não, melhor para ambos é estar quase certos
um do outro – exatamente onde
exatamente eu e exatamente o mundo
falham o encontro por um momento, e uma palavra.


03 julho 2020

mariana finochietto


Nunca fui tan hermosa
como a los cuarenta
cuando el mundo comenzó a apagarse
como si alguien hubiera dictado
el final de una fiesta.
Ah, qué precioso es el fin de las cosas,
todo el cuerpo extendido hacia el disfrute
de los últimos instantes.
Es
como el final del deseo,
ese momento en que no importa
si sos vos
o no sos,
sólo sucede estar allí,
en un cuerpo
habitando la cueva de la sangre,
el corazón
en un pulso feroz latiendo,
latiendo.

Un animal
irguiéndose en sus pies
es siempre majestuoso.


Nunca fui tão linda
como aos quarenta
quando o mundo se começou a apagar
como se alguém tivesse sentenciado
o fim de uma festa.
Ah, quão precioso é o fim das coisas
o corpo todo estendido para a fruição
dos últimos instantes.
É
como o fim do desejo
nessa altura não importa
se és tu
ou não,
a única coisa é estar ali,
num corpo
habitando a cova do sangue,
o coração
em impulso feroz, latindo,
latindo.

Um animal
erguendo-se nos seus pés
é sempre majestoso.

30 junho 2020

lisa carrasco


sorry for laughing at your funeral

deja de hacer esos ruiditos
como si no supieras de lo que hablo
en aquel lugar de la mesa
donde nacen las víctimas
tengo que colgar pero
tendrías que haber visto su cara
quién diría que la cocina
es un terreno tan fértil
estamos aquí reunidos
porque su cuerpo amarillo
me recibió un día
y nos abrazamos
así comprendí que la espera
es virtud de héroes
mientras más rápido lo consigues
menos te ríes
acabo de llegar y no puedo
creer que ya estás aquí
tendrías que haber visto
el lugar era un completo desastre


sorry for laughing at your funeral

deixa de fazer esses barulhinhos
como se não soubesses do que estou a falar
nesse lugar da mesa
onde nascem as vítimas
tenho de desligar mas
havias de ter visto a sua cara
quem diria que a cozinha
é um terreno tão fértil
estamos aqui reunidos
porque o seu corpo amarelo
me recebeu uma vez
e nos abraçamos
assim compreendi que a espera
é virtude de heróis
quanto mais depressa atinges
menos te ris
acabo de chegar e não consigo.
Acreditar que já estás aqui
terias de ter visto
o lugar era um completo desastre

27 junho 2020

marelys valencia


Incrédula

pende sobre mi lengua
el metal filoso
yo, el inquebrantable Damocles
domando la cacofonía de la duda,
el tintineo de la sílaba sugerida en el sonido punzante,
líquido.
mientras se tersa el impulso del fonema desbandado
como la cámara fotográfica de Blow up
contra el sujeto
y éste sin entender nada,
errático ante el disparo de la muerte.


Incrédula

pende sobre a minha língua
o metal afiado
eu o inabalável Dâmocles
domesticando a cacofonia da dúvida,
o tilintar da sílaba sugerida no som perfurante,
líquido.
enquanto se entesa o impulso do fonema desbandado
como a câmara fotográfica de Blow up
contra o sujeito
errático ante o disparo da morte.

24 junho 2020

paula simonetti


La conversación

Me quedo quieta para oírte mejor
a ratos veo que el sonido de tu voz
se enreda con el frío y con el humo
como si no estuvieras diciendo palabras
sino echando monedas de aire al aire

estás indefensa
ante las palabras que decís

te volviste tan alta como yo
sin que nos diéramos cuenta
crecías mientras tomaba el tren
charlaba con amigas que a su vez
tenían hijos o compraban autos
y se separaban
iba y venía del supermercado
y no te decía más que cómo estás
qué linda estás cómo te fue te felicito
querés venir querés que vaya a visitarte

pero me quedo quieta y miro
las piedritas que tirás
en el agua estancada
de esta conversación que no repara
de esta compañía que no alberga
la promesa de permanecer más que este rato

que te acompaño, te digo
apoyo lento mi mano sobre tu rodilla
todavía más frágil que la mía
y te acompaño, repito
como si a fuerza de reiteración
mis palabras se volvieran cosas ciertas

la silueta de una mariposa muerta
se te forma en la mirada y se te pudre
la boca antes de hablar

una familia es un paisaje
de abandonos y de mesas
la luz menor que da este encendedor
no es suficiente para ir hacia atrás
río adentro
cerrar la última habitación
donde hubo infancia
decir que no, gritar que no
prender la luz

y ver cómo se incendia y se disipa
por fin todo el terror debajo
de tu cama

y no te alcanza


A conversa

Fico imóvel para te ouvir melhor
por vezes perceciono que o som da tua voz
se enreda com o frio e com o fumo
como se não estivesses a dizer palavras
mas sim a deitar moedas de ar para o ar

estás indefesa
diante das palavras que dizes

tornaste-te tão alta quanto eu
sem que déssemos conta
crescias enquanto apanhava o comboio
parlendava com amigas que por sua vez
tinham filhos ou compravam carros
e se separavam
ia e vinha do supermercado
e apenas te dizia como estás
que linda estás como vão as coisas parabéns
queres vir queres que vá visitar-te

mas fico imóvel e olho
os seixos que atiras
para a água estagnada
desta conversa que não repara
desta companhia que não hospeda
a promessa de permanecer mais que este instante.

Acompanho-te, digo-te
apoio lentamente a minha mão sobre o teu joelho
ainda mais frágil que o meu
acompanho-te, repito
como se por força de reiteração
as minhas palavras se tornassem coisas certas

a silhueta de uma borboleta morta
forma-se no teu olhar e apodrece-te
a boca antes de falar

uma família é uma paisagem
de abandonos e de mesas
a luz menor que dá este isqueiro
não é suficiente para ir para trás
rio adentro
fechar o último quarto
onde houve infância
dizer que não, gritar que não
acender a luz

e ver como se incendeia e dissipa
por fim todo o terror debaixo
da tua cama

e não te alcança

21 junho 2020

dorianne laux


Evening

Moonlight pours down
without mercy, no matter
how many have perished
beneath the trees.

The river rolls on.

There will always be
silence, no matter
how long someone
has wept against
the side of a house,
bare forearms pressed
to the shingles.

Everything ends.
Even pain, even sorrow.

The swans drift on.

Reeds bear the weight
of their feathery heads.
Pebbles grow smaller,
smoother beneath night’s
rough currents. We walk

long distances, carting
our bags, our packages.
Burdens or gifts.

We know the land
is disappearing beneath
the sea, islands swallowed
like prehistoric fish.

We know we are doomed,
done for, damned, and still
the light reaches us, falls
on our shoulders even now,

even here where the moon is
hidden from us, even though
the stars are so far away.



Tarde

Derrama-se o luar
sem piedade, não importa
quantos tenham perecido
debaixo das árvores.

O rio continua a correr

Sempre haverá
silêncio, não importa
quanto tempo alguém
chore contra
o lado de uma casa,
antebraços nus pressionados
contra as telhas.

Tudo acaba.
Até a dor, até a tristeza.

Os cisnes seguem em frente.

Os juncos suportam o peso
de suas cabeças emplumadas.
Seixos crescem menores,
mais suaves sob as
correntes ásperas da noite. Nós andamos

longas distâncias, carregando
nossas malas, nossos pacotes.
Cargas ou prendas.

Sabemos que a terra
está a desaparecer debaixo
do mar, ilhas engolidas
como peixes pré-históricos.

Sabemos que estamos condenados,
perdidos, amaldiçoados, e mesmo assim
a luz chega até nós, cai
em nossos ombros mesmo agora,

mesmo aqui onde a lua está
escondida de nós, mesmo que
as estrelas estejam tão distantes.

18 junho 2020

elvira alejandra quintero



Amanecer

Acércate a la ventana y sosiega tus voces con la bruma que emerge de los andenes.
Recuerda otros amaneceres cifrados por el descubrimiento de una verdad, en medio del licor y el entusiasmo compartido con las almas amigas.
Y deja que sea solamente un recuerdo.
Sin llorarlo mira hacia afuera, hacia el otro lugar que tu ahora se esfuerza por volver real y posible.
Allí el sueño de anoche, sus voces, sus oleadas de persecución y sus breves fragmentos de calma. Su humedad, su martirizante dicha.
La insana, loca pregunta.


Amanhecer

Vem para a janela e aplaca as tuas vozes com a névoa que emerge das gares.
Lembra-te de outros amanheceres cifrados pela descoberta de uma verdade, no meio de licores e entusiasmos partilhados com almas amigas.
E deixa que seja apenas uma lembrança.
Sem chorar, olha para fora, para o outro lugar que tu agora te esforças para tornar real e possível.
o sonho da noite passada, as suas vozes, as suas ondas de perseguição e os seus breves fragmentos de calma. Sua humidade, a sua martirizante fortuna.
A louca, louca pergunta.

15 junho 2020

esther tellermann



Là j’ai croisé
Les eaux musicales.
Brumes enveloppaient nos promenades
Nous étions
rameurs nous
promenions l’archet
sur les mondes creux
devenus plus légers
nous maintenions le rêve
nous nous fîmes
pluie
pour sérier l’absence.


Então cruzei
As águas musicais.
As brumas envolviam as nossas caminhadas
Estávamos
remadores
passeávamos o arco
nos mundos ocos,
tornados mais leves
mantivemos o sonho
fizemo-nos
chuva
para ordenar a ausência.

12 junho 2020

ada limón



What I Didn’t Know Before

was how horses simply give birth to other
horses. Not a baby by any means, not
a creature of liminal spaces, but a four-legged
beast hellbent on walking, scrambling after
the mother. A horse gives way to another
horse and then suddenly there are two horses,
just like that. That’s how I loved you. You,
off the long train from Red Bank carrying
a coffee as big as your arm, a bag with two
computers swinging in it unwieldily at your
side. I remember we broke into laughter
when we saw each other. What was between
us wasn’t a fragile thing to be coddled, cooed
over. It came out fully formed, ready to run.

O que eu antes não sabia

era como os cavalos simplesmente dão à luz
outros cavalos. Não um bebé de modo algum, não
uma criatura de espaços liminares, mas sim uma
besta de quatro patas empenhada em andar, resfolegando 
atrás da mãe. Um cavalo dá caminho a outro
cavalo e então de repente existem dois cavalos,
assim mesmo. Foi assim que te amei. Tu,
saindo do longo comboio de Red Bank levando
um café tão grande quanto o teu braço, um saco pesado com dois computadores basculando
ao teu lado. Recordo que nos desatamos a rir
quando olhamos um para o outro. O que existia entre
nós não era uma coisa frágil que exigisse mimo ou trato
especial. Apareceu plenamente feito, pronto para correr.


09 junho 2020

nelly arcan


Et ses doigts rendus croches d'être si fort rongés, ses doigts tordus de ne servir à rien, il faut dire que ma mère ne se ronge pas les ongles avec la bouche, tout occupée à n'être qu'une fente, mais avec ses doigts qui se mangent les uns les autres, ça fait tac lorsque l'ongle écorche un doigt, un tac qui laisse des gouttelettes de sang sur quoi elle tac encore, des points rouges dont elle ne se préoccupe pas, ma mère et ses mains qui s'affrontent sur ses cuisses comme si elles avaient une vie propre, comme si de rien n'était, comme si tout le reste du corps, jusque-là resté dans une torpeur de vieille folle, n'existait que pour assister à leur agitation, et elle fait ça tout le temps et sans rien dire car elle ne parle pas, elle crie ou elle se tait, elle garde le silence avec le tac de ses doigts qui envahit la pièce, une horloge à pendule qui se fait remarquer dans les temps morts, le dimanche après-midi, lorsque les enfants jouent dehors, et ce silence me rend folle, nous sommes deux folles qui gardons le silence pour mieux nous détester.


E os seus dedos feitos colcheia de tão fortemente roídos, os seus dedos tortos de não servirem para nada, deve dizer-se que minha mãe não rói as unhas com a boca, totalmente ocupada a ser apenas uma fenda, mas com os seus dedos comendo-se uns aos outros, o que faz um tac quando a unha esfola um dedo, um tac que deixa gotículas de sangue em cima das quais ela faz tac ainda, pontos vermelhos com os quais não se preocupa, a minha mãe e suas mãos que se confrontam nas suas coxas como se tivessem vida própria, como se nada tivesse acontecido, como se o resto do corpo, até então pairado num torpor de velha louca, existisse apenas para assistir à sua agitação, e ela faz isso o tempo todo e sem dizer nada porque não fala, grita ou fica calada, permanece calada com o tac do seus dedos que invade a sala, um relógio de pêndulo que dá sinal de si nos tempos mortos, domingo à tarde, quando as crianças brincam lá fora, e tal silêncio deixa-me louca, somos duas pessoas loucas que ficam caladas para melhor se detestarem.

06 junho 2020

a. e. stallings

Burned
 
You cannot unburn what is burned.
Although you scrape the ruined toast,
You can’t go back. It’s time you learned
 
The butter cannot be unchurned,
You can’t unmail the morning post,
You cannot unburn what is burned–
 
The lovers in your youth you spurned,
The bridges charred you needed most.
You can’t go back. It’s time you learned
 
Smoke’s reputation is well earned,
Not just as an acrid, empty boast–
You cannot unburn what is burned.
 
You longed for home, but while you yearned,
The black ships smoldered on the coast;
You can’t go back. It’s time you learned
 
That even if you had returned,
You’d only be a kind of ghost,
You can’t go back. It’s time you learned
 
That what is burned is burned is burned.
 
 
 
Queimança
 
Não está possível desqueimar o queimado.
Por muito que se raspem as ruínas da torrada,
Não está possível voltar atrás. Está na hora de aprender.
 
A manteiga não pode ser desbatida,
Não se pode desenviar o correio remetido de manhã
Não está possível desqueimar o queimado -
 
Amantes que a juventude desprezou
Pontes carbonizadas quando eram precisas,
Não está possível voltar atrás. Está na hora de aprender.
 
O fumo tem uma reputação justamente merecida.
Não apenas de ser acre, vã glória -
Não está possível desqueimar o queimado.

Sentias falta da casa, mas enquanto almejavas,
Os barcos negros iam ardendo na costa;
Não está possível voltar atrás. Está na hora de aprender.

Mesmo se houvesse regresso
Seria sob forma espectral
Não está possível voltar atrás. Está na hora de aprender.

Que a queimança é queimança é queimança.


03 junho 2020

beatriz estrada moreno


La teoría de Sjögren

La casa se llenó de hormigas.
Fue la noche de la sequía y
las abundantes lagañas,
el día en que tu cuerpo se volvió contra ti.

Tú:
un dolor de músculos ardientes
y manos frías;
un país sin nombre
que busca colonizar el agua.

Hay en la frontera del mundo un bosque.
Una plaga de escarabajos ataca sus troncos
y todo funciona.

Solía escuchar de joven que
uno no ha abandonado nada.
La mayoría de lo que vemos
no existe.

Ese día mientras bañabas a tu madre
me reconocí en sus pliegues,
las grandes manchas en su cuello
formando continentes,
tierras extrañas.

Tú luchabas por una nueva conquista:
sorber con tu boca de niña
todo el líquido de sus pechos.

También el mar.
Lame los bordes del mundo
y queman.

La memoria del hambre.

Salivo.

Hay sabores más agradables con el miedo.

Un forastero me preguntó si aquí también
caen las hojas de los árboles;
como cuando un niño toma conciencia
que el planeta gira y su silencio
hace que las cosas germinen.

En nuestra órbita gravitan
pedazos de antiguos cohetes y satélites,
restos de nuestras exploraciones.
De eso se conforma la materia;
la luz que nos cubre es de estrellas muertas.

Nada está lo suficientemente húmedo.
Labramos la tierra sin poseerla
como el cuerpo.

A esta hora la última chispa
[de saliva]
y la gravedad
tira tus dientes como frutos.

Enséñame el arte de devorarnos.



A teoria de Sjögren

A casa encheu-se de formigas.
Foi noite de seca e
abundantes remelas,
o dia em que o teu corpo se voltou contra ti.

Tu :
Uma dor de músculos ardentes
e mãos frias;
um país sem nome
que procura colonizar a água.

Há na fronteira do mundo um bosque.
Uma praga de besouros ataca os seus troncos
e tudo funciona.

Costumava ouvir em jovem que
ninguém abandonou nada.
A maioria do que vemos
não existe.

Nesse dia enquanto davas banho à tua mãe
Reconheci-me nos seus vincos
nas grandes manchas do seu pescoço
formando continentes,
terras estranhas.

Tu lutavas por uma nova conquista:
sorver com a tu boca de criança
todo o líquido dos seus peitos.

Também o mar.
Lambe os limites do mundo
e queimam.

A memória da fome.

Salivo.

Há sabores mais agradáveis com o medo.

Um forasteiro perguntou-me se aqui também
caem as folhas das árvores;
como quando uma criança toma consciência
que o planeta gira e o seu silêncio
faz com que as coisas germinem.

Na nossa órbita gravitam
pedaços de antigos foguetões e satélites,
restos de nossas explorações.
Disso se conforma a matéria;
a luz que nos cobre é de estrelas mortas.

Nada está suficientemente húmido.
Lavramos a terra sem a possuir
como o corpo.

A esta hora a última chispa
[de saliva]
e a gravidade
derruba os teus dentes como frutos.

Ensina-me a arte de nos devorarmos.