29 agosto 2021

louise glück

 

The Past


Small light in the sky appearing

suddenly between

two pine boughs, their fine needles


now etched onto the radiant surface

and above this

high, feathery heaven—


Smell the air. That is the smell of the white pine,

most intense when the wind blows through it

and the sound it makes equally strange,

like the sound of the wind in a movie—


Shadows moving. The ropes

making the sound they make. What you hear now

will be the sound of the nightingale, Chordata,

the male bird courting the female—


The ropes shift. The hammock

sways in the wind, tied

firmly between two pine trees.


Smell the air. That is the smell of the white pine.


It is my mother’s voice you hear

or is it only the sound the trees make

when the air passes through them


because what sound would it make,

passing through nothing?



O Passado


Surge no céu uma luz ténue

de repente entre

dois galhos de pinheiro, as finas agulhas


agora gravadas na superfície radiante,

e em cima este

céu alto, leve como uma pena…


O ar cheira . É o aroma do pinheiro branco,

mais intenso quando o vento sopra ao atravessá-lo

e o som que produz torna-se igualmente estranho,

como o som do vento num filme...


Sombras em movimento. As cordas

fazendo o som que faem. O que se ouve agora

será o som do do rouxinol, chordata,

o pássaro macho seduzindo a fémea ...


As cordas cedem. A rede

balança no vento, amarrada

firmemente entre dois pinheiros.


O ar cheira . É o aroma do pinheiro branco.


É a voz da minha mãe o que se ouve

ou apenas o barulho das árvores

manuseadas pelo vento.


porque qual o som que faria

se não passasse por nada?


27 agosto 2021

olvido garcía valdés

 

cazuela a fuego lento, lo que el temor

cocina se transforma o trasmuta y puede

convertirse en bondad, ver desde fuera, un tú

sin proyecciones, ay, si guardara calor aquella

lumbre prado verde, racheado, casi

sin luz, con flores de aligustres y cimas

de ciprés, había dos niñas, había entonces

más cipreses, dejar que todo vaya, ir

viéndolo pasar y que no haya

nadie y no haya nada



caçarola em fogo lento, o que o medo

cozinha é transformado ou transmuta e pode

tornar-se bondade, ver de fora, um tu

sem projeções, ai, se mantivesse calor aquele

lume prado verde, rachado, quase

sem luz, com flores de alfenas e cumes

de cipreste, havia duas meninas, havia então

mais ciprestes, deixar que tudo vá, assistir

ao seu passar e que não haja

ninguém e não haja nada


25 agosto 2021

etel adnan

 

La lune a fermé un ou deux rideaux. Une pluie fine interfère.

Je mesure ma mémoire des choses, mais non pas la mémoire elle-même, puisque le présent est aussi en train de déborder.

Nous créons la réalité rien qu'en existant. Ceci est tout aussi vrai pour la chouette qui somnole en ce moment sur une branche.

Un tigre dompté est aussi insignifiant que les gens qui prennent l'escalator de ce bâtiment. L’angoisse noyée dans le vin rouge revient comme le coucher du soleil.

En bas, dans la vallée, la guerre déploie sa logique ; de l'autre côté du ranch l'océan fait monter sa colère.

Mon père est né l'année où l'idée de l'éternel retour vint à l'esprit de Nietzsche ; probablement le même jour.

Un arbre a toujours du courage. D'ailleurs, nous sommes juste une fenêtre sur le monde.

Nous avons besoin d'un buisson de roses sur le balcon et que le téléphone ne sonne pas.

J'ai vécu uniquement par mes propres moyens, voilà pourquoi je suis un fleuve.

La mort n'était ni chaude ni froide lorsqu'elle touchait ta peau. La volonté n'est jamais affrétée, la matière est frustrée par ses limites.

Je voudrais que tu me voies étendue sur l'empreinte laissée par ton corps sur le lit, mais dans nos âmes la chaleur t'appartient.

C'est arrivé dans des années dont personne ne se souvient. Je n'ai pas tenté de faire quoi que ce soit de plus.

Ma propre disparition suivit un nuage qui m'avait trouvée assise dans un jardin.

Les tunnels reproduisent les schémas des artères. Il y a un ver dans le cœur qui se nourrit de sa pitance et dans la cour des oiseaux pour qui l’histoire importe peu, bien qu’elle ait brisé nos vies.

Un jour, le soleil ne se lèvera pas à son heure, alors le jour ne sera pas. Et en l’absence de jour, il n’y aura pas de nuit non plus. Ainsi, la Révélation se sera accomplie.



A lua fechou uma ou duas cortinas. Uma chuva fina interfere.

Meço a minha memória das coisas, mas não a própria memória, já que o presente também está a transbordar.

Nós criamos a realidade apenas por existir. Isso também é verdade para a coruja que cochila neste momento em cima de um ramo.

Um tigre domesticado é tão insignificante como as pessoas que usam escadas rolantes neste edifício. A angústia afogada no vinho tinto torna a vir como o pôr do sol.

Lá em baixo, no vale, a guerra implanta a sua lógica; do outro lado do rancho, o oceano faz aumentar a sua raiva.

O meu pai nasceu no ano em que a ideia do eterno retorno veio ao espírito de Nietzsche, provavelmente no mesmo dia.

Uma árvore sempre tem coragem. Aliás, nós somos apenas uma janela para o mundo.

Precisamos de um matagal de rosas na varanda e que o telefone não toque.

Vivi unicamente pelo meu próprios meios, é por isso que sou um rio.

A morte não era quente nem fria quando tocava a tua pele. A vontade nunca está aflorada, a matéria está frustrada pelos seus limites.

Gostaria que me visses estendida na impressão deixada pelo teu corpo na cama, mas nas nossas almas o calor pertence a ti.

Aconteceu nos anos de que ninguém se lembra. Não tentei fazer mais qualquer outra coisa.

O meu próprio desaparecimento seguiu uma nuvem que me tinha encontrado sentada num jardim.

Os túneis reproduzem os padrões das artérias. Há um verme no coração que se alimenta da sua pitança e no pátio dos pássaros para quem a história pouco importa, apesar de ter arruinado as nossas vidas.

Um dia, o sol não se levantará a seu tempo, então o dia não estará. E na ausência do dia, também não haverá noite. Assim, a Revelação será cumprida.



23 agosto 2021

dolores dorantes

 

Mientras la estructura permanezca intacta retiene su valor y el odio no requiere sobresalir. Cuando la estructura colapsa, cuando se hacen promesas imposibles, cuando se pierde una parte de poder, el odio aparecerá en la superficie. Odiar a otros que quieren amor a cambio de poder. El éxito del mundo. Amor a cambio de poder. El cumplimiento del deber. Reversible. Otra incapacidad: vivir el duelo de la vida, vivir el duelo de la destrucción. ¿Qué harás ahora tú en medio del colapso de la estructura? En ti germina. En ti germina una herida. La herida abierta. ¿Cómo vivir un duelo desde la carencia de autenticidad? Tu personalidad es la mentira sobre el amor ¿Te estás borrando?

La humanidad se hubiera ahorrado tanto horror. Tu patología, bajo llave, encerrada en el cumplimiento del deber. El ser incapaz de sentir. El ser sin ser. La humanidad se hubiera ahorrado tanto horror.

Bienvenido al camino de tu psicosis. Bienvenido al camino de la confrontación. Bienvenido al camino de tu dolor. Bienvenido a tu cobardía. Cualquier otro camino carece de esperanza. Volverse a armar. Tu contra.



Enquanto a estrutura permanecer intacta retém o seu valor e o ódio não requer sobressair. Quando a estrutura colapsa, quando se fazem promessas impossíveis, quando se perde uma parte do poder, o ódio aparecerá na superfície. Odiar outros que querem amor em troca de poder. O sucesso do mundo. Amor em troca de poder. O cumprimento do dever. Reversível. Outra incapacidade: viver o duelo da vida, viver o duelo da destruição. O que farás tu agora no meio do colapso da estrutura? Em ti germina. Em ti germina uma ferida. A ferida aberta. Como viver um duelo a partir da carência de autenticidade? A tua personalidade é a mentira sobre o amor. Estás a apagar-te?

A humanidade ter-se-ia poupado a tanto horror. A tua patologia, trancada, fechada no cumprimento do dever. O ser incapaz de sentir. O ser sem ser. A humanidade ter-se-ia poupado a tanto horror.

Bem-vindo ao caminho da tua psicose. Bem-vindo ao caminho do confronto. Bem-vindo ao caminho da tua dor. Bem-vindo à tua covardia. Qualquer outro caminho carece de esperança. Voltar a armar. Ao contrário de ti.


21 agosto 2021

jeannette l. clariond

 Abandono I


Saliste corriendo por la playa como potranca desbocada.

Tus gafas se quedaron flotando bajo la luna.

Tomé el auto, y me fui al hotel.


Al llegar me asomé por la ventana, pero no regresaste.

Nunca regresaste. Aunque por la mañana nos dimos los buenos días

como si nada hubiera ocurrido.


Como si al correr lejos de mí, tu cuerpo lastimado lastimándome se hubiera ido

para siempre. Regresaste con tu cuerpo llagado.

Nunca la sangre había corrido con tal fuerza por la playa.



Abandono I


Saíste a correr pela praia como uma potranca desbocada.

Os teus óculos ficaram a flutuar sob a lua.

Peguei o carro e fui para o hotel.


Quando cheguei, fui ver à janela, mas não voltaste.

Nunca voltaste. Embora pela manhã nos tivéssemos dado os bons dias

Como se nada tivesse acontecido.


Como se ao correres longe de mim, o teu corpo ferido se tivesse ido

para sempre. Regressaste com o teu corpo em chaga.

Nunca o sangue tinha corrido com tanta força pela praia.


19 agosto 2021

laure cambau

 

Au confluent des sens et de la langue

tu mets des chaussettes aux arbres

un bonnet au sexe des statues

et des mots sur les papillons de l’intérieur


Na confluência dos sentidos e da língua

Colocas peúgas nas árvores

um gorro no sexo das estátuas

e palavras sobre borboletas de dentro


Quand nos œufs et nos seins seront carrés

la ponte sera géométrique

et ta main blessée

par mes angles


Quando os nossos ovos e os nossos seios estiverem quadrados

a postura será geométrica

e a tua mão ferida

pelos meus ângulos


17 agosto 2021

anahí maya garvizu

 

Indicios de una ceguera


Debía sentir el paso del tiempo

como la ola que se retira

abandonando la playa del recuerdo.

J.M.G Le Clezio


Tengo un afecto especial por las sensaciones

que aún son innombrables en el diccionario,

como la lentitud con la que el rostro de mis antepasados

comienza a borrarse.

Sus ojos azabaches se tornan transparentes ahora.

Uno va perdiendo la vista de a poco.

Lo primero que se extraña

es la vivacidad de los colores cálidos:

una porcelana china

dejada por descuido sobre el mantel,

ciruelos en la canasta de frutas,

la diferencia en la tonalidad de los frijoles

y un invierno no del todo gris.


Los recuerdo menos:

las manos de ella trenzando mis cabellos,

el cuerpo de él sobre el caballo contorneado por el paisaje;

su imagen -la de ellos-

esta mañana parece una tímida marca de agua

al borde del papel.



Indícios de uma cegueira


Devia sentir o passar do tempo

como a onda que se retira

deixando a praia da lembrança.

J.M.G Le Clezio


Tenho um afeto especial pelas sensações

que ainda são inomináveis no dicionário,

como a lentidão com que o rosto dos meus antepassados

começa a desaparecer.

Os seus olhos esbugalhados tornam-se transparentes agora.

Perde-se a visão pouco a pouco.

A primeira coisa de que se sente falta

é a vivacidade das cores quentes:

uma porcelana chinesa

deixada por descuido sobre a toalha,

ameixas na cesta da fruta,

a diferença na tonalidade dos feijões

e um inverno não totalmente cinza.


Lembro-me menos deles:

as mãos dela entrançando os meus cabelos,

o corpo dele sobre o cavalo contornado pela paisagem;

a sua imagem -a deles-

parece esta manhã uma tímida marca d'água

à margem do papel.



Preludio bajo cero II


Las flores ya no soportan más floreros,

Los tapices son estáticos como un dólmen dictador.

En este lugar, las palabras queman la piel.

Plancharé tus arrugas como un papiro interminable

Si dejas que siga los pasos de Linkous

Ansío tanto llegar al Kailas sagrado

Como un pez entre leñas ansía volver al mar.

Sobre la mesa está el anís y la manzanilla

Que ya no tomaré

las cucharillas en fila india reflejan el parpadeo

del cigarrillo en la penumbra de la sala

Ahora puedes encenderlo antes de que me haya dormido.

Poco he avanzado, veo en tus ojos

mis huellas de arcilla mal horneada.



Prelúdio abaixo de zero II


As flores já não suportam mais vasos,

Os tapetes são estáticos como um dólmen ditador.

Neste lugar, as palavras queimam a pele.

Passarei a ferro as tuas rugas como um papiro interminável

Se deixares que siga os passos de Linkous

Anseio tanto chegar ao Kailas sagrado

Como um peixe entre lenha anseia voltar ao mar.

Sobre a mesa está o anis e a camomila

Que já não tomarei

as colheres de chá em fila indiana refletem a centelha

do cigarro na penumbra da sala

Agora podes acendê-lo antes que eu adormeça.

Pouco andei, vejo nos teus olhos

as minhas marcas de argila mal cozida.



15 agosto 2021

rocío ágreda piérola

 

No ayuda nada


Qué haré de mí

mi hermana me odia

mi propio odio es padre del odio de mi padre

mi odio mima a mi padre

mi padre saca a patadas a su odio

el odio de mi padre me defiende de mi propio odio

suturo desde el presente un pasado dolido futurísimo

mi madre soy yo

me ridiculizo

me atormento por las noches

soy mi propia madre

alimento gatitos debajo de mi ala

alimento a los piojos en torno a mi pensamiento

no haré nada hoy

si no crío cuervos

si no les enseño a mirarnos a los ojos.



Não ajuda nada


O que farei de mim

a minha irmã odeia-me

o meu próprio ódio é pai do ódio do meu pai

o meu ódio mima o meu pai

o meu pai expulsa o seu ódio

o ódio do meu pai defende-me do meu próprio ódio

suturo desde o presente um passado dorido futuríssimo

a minha mãe sou eu

ridicularizo-me

atormento-me durante a noite

sou a minha própria mãe

alimento gatinhos sob as minhas saias

alimento piolhos em torno do meu pensamento

não vou fazer nada hoje

se não criar corvos

se não os ensinar a olhar-nos nos olhos.


13 agosto 2021

leonor saro

 


Medea y Lilith invocan a Dioniso


En Colcos las muchachas somos impías:

invocamos a Satán con las mejillas manchadas

con la sangre de los venados de la caza,

nos ponemos hasta el culo de Cutty Sark

y escuchamos en éxtasis a Chet Baker.

Caiga sobre mí la sangre de mi hermano

y la traición hacía la estirpe de mi padre.

El honor es para vírgenes.

El honor es para vírgenes bobas con una paga mensual.


Euán, Elelei, no quiero que mi carne sea carne de otra carne.


Yahvé me hizo del barro

y quiso darme un compañero


Así se hacen llamar,

“compañeros”,

“argonautas”,

“capitanes en la travesía”


Quería follarme como a una perra.


Euán, Elelei porque Dios creó el hombre a su imagen

a imagen de Dios lo creó

hembra y varón los creó


En Colcos las muchachas no tenemos pechos:

los amputamos y los tiramos al lodo.


Y Yahvé me condenó por mi osadía

y hoy la tumba de mis hijos aún sigue creciendo.

El castigo nunca viene de los cielos.

El hombre es una rata en su cloaca.


Euán, Elelei,

si vino y sangre son la misma cosa

¿no es embriaguez el dolor?

Pagaremos gustosas la deuda


Tu también eres madre de un cadáver

Cien hijos me mata Yahvé cada noche.


Voluntad.

Voluntad es la palabra más hermosa de pronunciar

¿no son bellos los hombres que se aman en la muerte?


Euán, Elelei. Euán, Elelei. Henchid la tierra y embriagadla





Medeia e Lilith invocam Dionísio


Em Colcos, nós, as raparigas, somos ímpias:

invocamos Satã com as bochechas manchadas

com o sangue dos veados da caça,

enchemos as ventas de Cutty Sark

e ouvimos em êxtase Chet Baker.

Caia sobre mim o sangue do meu irmão

e a traição à estirpe do meu pai.

A honra é para virgens.

A honra é para virgens idiotas com um salário mensal.


Euán, Elelei, não quero que a minha carne seja carne de outra carne.


Javé fez-me do barro

e quis dar-me um companheiro


É assim são chamados,

"companheiros",

"Argonautas",

"capitães na travessia"


Queria foder-me como a uma cadela.


Euán, Elelei, porque Deus criou o homem à sua imagem

à imagem de Deus o criou

feminino e masculino os criou


Em Colcos nós, as raparigas, não temos peitos:

amputamo-los e atiramo-los para a lama.


E Javé condenou-me pela minha ousadia

e hoje o túmulo dos meus filhos ainda continua a crescer.

O castigo nunca vem dos céus.

O homem é um rato no seu esgoto.



Euán, Elelei,

se vinho e sangue são a mesma coisa

não é embriaguez a dor?

Pagaremos de bom grado a dívida


Tu também és mãe de um cadáver

Cem filhos me mata Javé todas as noites.


Vontade.

Vontade é a palavra mais bela de se pronunciar

Não são belos os homens que se amam na morte?


Euán, Elelei. Euán, Elelei. Enchei a terra e embriagai-a


11 agosto 2021

victoria vaccaro garcía

 

Símbolos de ondas quedaron

como monumentos crípticos de amor y violencia.


Terreno de espectáculos de tu sangre

esta cintura que abandoné,

bestiario de ídolos sin nacer

cercenado para siempre.


Esfinge

abrazada

por hijos-cadáveres-ratas,

me agolparé en tus párpados.


Déjame sufrir la última claridad.


Caminarte es repetirte,

sentir tu sombra acorralándome.



Símbolos de ondas ficaram

como monumentos crípticos de amor e violência.


Terreno de espetáculos do teu sangue

esta cintura que abandonei,

bestário de ídolos não nascidos

amputado para sempre.


Esfinge

abraçada

por filhos-cadáveres-ratos,

aninhar-me-ei em tuas pálpebras.


Deixa-me sofrer a última claridade.


Caminhar-te é repetir-te,

Sentir a tua sombra a encurralar-me.


09 agosto 2021

fabienne swiatly

 

D’une voix portée par un souffle profond, elle exige d’un chef de chantier qu’il retire les photos accrochées sur les murs de l’atelier. Femmes dénudées et entrouvertes qui offrent au regard ce qui se cache d’habitude, avec ou sans épilation. Menuisière débutante qui s’impose à toute une équipe d’hommes. Il a rougi avant de répondre OK, comme si elle désignait une salissure sur son pantalon.


Com uma voz incorporada por um sopro profundo, ela exige que um encarregado de obras retire as fotos penduradas nas paredes do atelier. Mulheres nuas e entreabertas que oferecem ao olhar o que normalmente se esconde, com ou sem depilação. Carpinteira principiante que se impõe a uma equipa inteira de homens. Ele corou antes de responder OK, como se ela apontasse para uma mancha nas suas calças.


07 agosto 2021

amelia rosselli

 
Di sollievo in sollievo, le strisce bianche le carte bianche
un sollievo, di passaggio in passaggio una bicicletta nuova
con la candeggina che spruzza il cimitero.

Di sollievo in sollievo on la giacca bianca che sporge marroncino
sull’abisso, credenza tatuaggi e telefoni in fila, mentre
aspettando l’onorevole Rivulini mi sbottonavo. Di casa in casa

telegrafo, una bicicletta in più per favore se potete in qualche
modo spingere. Di sollievo in sollievo spingete la mia bicicletta
gialla, il mio fumare transitivi. Di sollievo in sollievo tutte

le carte sparse per terra o sul tavolo, lisce per credere
che il futuro m’aspetta.

Che m’aspetti il futuro! Che m’aspetti che m’aspetti il futuro
biblico nella sua grandezza, una sorte contorta non l’ho trovata
facendo il giro delle macellerie.



De alívio em alívio, as listas brancas os papéis brancos
um alívio, passo a passo uma bicicleta nova
com a lixívia que polvilha o cemitério.

De alívio em alívio em jaqueta branca que emerge castanho
sobre o abismo, crença tatuagens e telefones em linha enquanto
na espera do senhor deputado Rivulini me desabotoava. Casa a casa.

telégrafo, uma bicicleta extra, por favor caso possam de qualquer
modo empurrar. De alívio em alívio empurrem a minha bicicleta
amarela o meu fumar transitivo. De alívio em alívio todos

os papéis espalhados pelo chão ou sobre a mesa, lisos para acreditar
que o futuro me espera.

Que o futuro me espere! Que me espere que me espere o futuro
bíblico, na sua grandeza, um destino distorcido que não encontrei
ao fazer a ronda dos açougues.

05 agosto 2021

juana adcock

Puertas que abiertas hacia adentro arden


Qué bendita dicha la de poder cerrar los ojos y ver alguien

cerrar los ojos


Que su antebrazo sienta las gotas y casi

antes de preguntar qué pasa se desmenuce su garganta en el suelo


Y qué bendita llave la que abría todas las puertas, la que

una tela humilde cruzábanos sus nudillos como manos en rezo

unos nudos temblorosos que se trenzaban en fardos, unos talones

¿quieres desnudar todos mis nudos? ¿abrir todas mis puertas?

sí, quiero abrir las puertas en tu pie: beso, las puertas en la uña de tu dedo gordo: beso, las puertas en tu astrágalo: beso, las puertas en tu sóleo: beso, las puertas en tu sartorio: beso, las puertas en tu pectíneo: beso, las puertas en tu hipocondrio: beso, las puertas en tu región del vacío, etcétera


Ayer vi los párpados volando hechos pedazos

los sitios salobres donde nos andábamos llorando

los huecos desanclados, desarraigados

el delgado canto que en la mañana nos alzaba


esa madre que no tengo, el huevo

detrás de mi cuello donde el hueco es el huevo es el hueco donde se gesta

el principio donde nace, esa sangre que se espesa, que se dispersa, que nos amarra


La neta: este piquete de avispa es mi única pertenencia, esa agua que se hacina detrás de las puertas en mi cara



Portas que abrem para dentro queimam


Que epifania afortunada poder fechar os olhos e ver alguém

fechar os olhos


Que o seu antebraço sinta as gotas e quase

antes de perguntar o acontecido despedace a sua garganta no chão

uma teia humilde entrelaçando os seus nós como mãos em prece


E quão epifânica a chave que abria todas as portas, a que

uns nós trémulos que se entrançavam em fardos, calcanhares

queres pôr a nu todos os meus nós? Abrir todas as minhas portas?

Sim, quero abrir as portas no teu pé: beijo, as portas na unhas do teu dedão: beijo, as portas

no teu astragalo: beijo, as portas no teu sóleo: beijo, as portas no teu sartório: beijo, as portas no teu

pectíneo: beijo, as portas no teu hipocôndrio: beijo, as portas na tua região do vazio, etcétera


Ontem vi as pálpebras voando feitas pedaços

os lugares salobres onde andávamos a chorar

os espaços desancorados, desenraizados

a finesse do canto que na manhã nos levantava


essa mãe que não tenho, o ovo

atrás do meu pescoço onde o buraco é o ovo é o buraco onde se gesta

o princípio onde nasce, esse sangue que se engrossa, que se dispersa, que nos amarra


O líquido: este piquete de vespa é a minha única pertença, essa água que se amontoa atrás das portas na minha cara


03 agosto 2021

natalie díaz

 

Why I Don’t Mention Flowers When Conversations

with My Brother Reach Uncomfortable Silences


Forgive me, distant wars, for bringing

flowers home.

Wislawa Szmborska



In the Kashmir mountains,

my brother shot many men,

blew skulls from brown skins,

dyed white desert sand crimson.


What is there to say to a man

who has traversed such a world,

whose hands and eyes have

betrayed him?


Were there flowers there? I asked.


This is what he told me:


In a village, many men

wrapped a woman in a sheet.

She did not struggle.

Her bare feet dragged in the dirt.


They laid her in the road

and stoned her.


The first man was her father.

He threw two stones in a row.

Her brother had filled his pockets

with stones on the way there.


The crowd was a hive

of disturbed bees. The volley

of stones against her body

drowned out her moans.


Blood burst through the sheet

like a patch of violets,

a hundred roses in bloom.



Porque não falo de flores quando as conversas

com o meu irmão atingem silêncios incómodos


Perdoem-me, guerras distantes, por trazer

flores para casa.

Wislawa Szmborska


Nas montanhas de Caxemira,

meu irmão disparou contra muitos homens,

fez estourar crânios em peles morenas,

tingiu de carmesim a branca areia do deserto.


O que dizer a um homem

que atravessou tal mundo,

cujas mãos e olhos o levaram

a trair-se?


Havia flores nesse sítio? Perguntei


Eis o que ele me disse:


Numa aldeia, um bando de homens

embrulhou uma mulher num lençol.

A mulher não se defendeu

Os seus pés descalços arrastados na lama.


Deitaram-na na estrada

e apedrejaram-na.


O primeiro homem era o seu pai.

Atirou duas pedras de rajada.

O irmão dela tinha enchido os bolsos

com pedras apanhadas no caminho.


A multidão era um enxame

de abelhas perturbadas. A saraivada

de pedras contra o seu corpo

afogou os seus gemidos.


O sangue irrompeu no lençol

como uma mancha de violetas,

uma centena de rosas em flor.


01 agosto 2021

camille tillet

 

Je sens la vibration entrer dans mes pieds

Remonter mes jambes

Remplir mon bassin

Et accélérer mon cœur

Ça pulse, ça vibre

L’invisible est physique

Si je pouvais m’unir à la terre

Je propagerais le son plus vite que l’air

De mon promontoire je me tends comme une corde de contrebasse.


Sinto a vibração a entrar nos meus pés

Elevar as minhas pernas

Encher o meu tanque

E acelerar o meu coração

Algo pulsa, algo vibra

O invisível é físico

Se me pudesse unir com a terra

Espalharia o som mais depressa do que o ar

Do meu promontório estico-me como uma corda de contrabaixo.

30 julho 2021

denise le dantec

 

Coups de butoir du vent. Le schorre est vert grisé.

Sur la lande haute la lumière des bruyères donne la substance mate des choses.

Plus bas, entre les réseaux des filières, apparaissent des couleurs : orangé-noir des ajoncs Le Gall dont se nourrissaient les chevaux de retour des carrières d’Île à Canton, rouge des touffes d’obiones Les massifs de prunelliers qui entourent la Roche du Fort sont d’un blanc parfait.

L’odeur des premières fleurs de l’arabette, parfois plantées à même le sable, déjà enivre.


Porrada do vento. O lamaçal é verde acinzentado.

No areal alto a luz da urze fornece a substância mate das coisas.

Mais em baixo, no emaranhado das sendas, aparecem cores: laranja-preto dos tojos Le Gall, de que se alimentavam os cavalos de regresso das pedreiras da Ilha em Cantão, vermelho dos tufos halofíticos

Os maciços de ameixoeiras que cercam a Roche du Fort são de um branco perfeito.

O odor das primeiras flores de uma arabette, às vezes plantadas mesmo na areia, já embriaga.