1. Suppose I were to begin by saying that I had fallen in love with a color. Suppose I were to speak this as though it were a confession; suppose I shredded my napkin as we spoke. It began slowly. An appreciation, an affinity. Then, one day, it became more serious. Then (looking into an empty teacup, its bottom stained with thin brown excrement coiled into the shape of a seahorse) it became somehow personal.
2. And so I fell in love with a color—in this case, the color blue—as if falling under a spell, a spell I fought to stay under and get out from under, in turns.
3. Well, and what of it? A voluntary delusion, you might say. That each blue object could be a kind of burning bush, a secret code meant for a single agent, an X on a map too diffuse ever to be unfolded in entirety but that contains the knowable universe. How could all the shreds of blue garbage bags stuck in brambles, or the bright blue tarps flapping over every shanty and fish stand in the world, be, in essence, the fingerprints of God? I will try to explain this.
4. I admit that I may have been lonely. I know that loneliness can produce bolts of hot pain, a pain which, if it stays hot enough for long enough, can begin to simulate, or to provoke—take your pick—an apprehension of the divine. (This ought to arouse our suspicions.)
5. But first, let us consider a sort of case in reverse. In 1867, after a long bout of solitude, the French poet Stephane Mallarmé wrote to his friend Henri Cazalis: “These last few months have been terrifying. My Thought has thought itself through and reached a Pure Idea. What the rest of me has suffered throughout that long agony, is indescribable.” Mallarmé described this agony as a battle that took place on God’s “boney wing.” “I struggled with that creature of ancient and evil plumage—God—whom I fortunately defeated and threw to earth,” he told Cazalis with exhausted satisfaction. Eventually Mallarmé began replacing “le ciel” with “l’Azur” in his poems, in an effort to rinse references to the sky of religious connotations. “Fortunately,” he wrote Cazalis, “I am quite dead now.”
1. Suponhamos que começava por dizer que me apaixonei por uma cor. Suponhamos que falaria disto como se fosse uma confissão; suponhamos que desfaço em pedaços o meu guardanapo enquanto falamos. Começou paulatinamente. Uma apreciação, uma afinidade. E, um dia, tornou-se mais sério. Então (olhando para uma chávena vazia, de fundo manchado com um fino resíduo castanho enroscado em forma de cavalo-marinho) tornou-se de algum modo pessoal.
2. Apaixonei-me por uma cor, neste caso, a cor azul - como se caísse sob um feitiço, um feitiço pelo qual lutei, alternativamente, para ficar dentro e sair dele.
3. E então? É um engano voluntário, podias dizer. Cada objeto azul podia ser um tipo de sarça ardente, um código secreto feito para um único agente, um X num mapa demasiado difuso para ser desdobrado por completo, mas que contém todo o universo conhecido. Como é que todos os pedaços de sacos de lixo azuis presos nos arbustos, ou os toldos de azul vibrante que pairam em cima de cada cabana e banquinha de peixe no mundo, podiam ser, em essência, as pegadas de Deus? Tentarei explicar.
4. Admito que poderia sentir-me só. Sei que a solidão pode produzir ramalhetes de dor candente, uma dor que, se continuar a arder durante tempo suficiente, pode começar a parecer-se ou a provocar -tu escolhes- uma apreensão do divino. (Isto deveria despertar nossas suspeitas).
5. Mas, primeiro, consideremos um caso contrário. Em 1867, depois de um longo período de solidão, o poeta francês Stéphane Mallarmé escreveu ao seu amigo Henri Cazalis: “ Estes últimos meses foram terríveis. Meu Pensamento foi pensado e chegou a uma Ideia Pura. Tudo o que o resto do meu ser sofreu durante esta longa agonia é indescritível ». Mallarmé descreveu esta agonia como uma batalha que teve lugar na «ala ossuda» de Deus. «Lutei com essa entidade de plumagem antiga e malvada -Deus-, a quem por sorte venci e atirei para a terra», disse a Cazalis com uma satisfação esgotada. No fim, Mallarmé começou a substituir «le ciel» por «l'Azur» nos seus poemas, numa tentativa de lavar as suas referências à abóbada celestial de conotações religiosas. «Felizmente», escreveu a Cazalis, «já estou bem morto».