Michele
Ho il sangue dell’amico sotto i miei piedi.
Il suo morso sul dente della mia lancia.
Noi eravamo vicini, dividevamo a metà i sogni,
avevamo le stesse insegne sulla corazza.
Le sue ali erano più larghe delle mie,
coprivano meglio le distanze.
Più veloce nella corsa e nel riso,
più svelto a prevenire i desideri del genitore.
Egli ci guardava sorridendo, come a godere della nostra somiglianza.
Ma il suo viso era più bello del mio.
Meno sporco di approssimazione.
Spesso mi diceva che la gioia assoluta dell’eternità lo spaventava.
Parlava piano, come se in questo modo il padre non potesse udirlo.
Vedevo che questo pensiero gli cambiava le mani,
inceneriva la sua pelle.
Ho schizzi di sangue sulle pieghe nette della tunica.
Una striscia di terra attorcigliata alla cintura.
Una corona spinata attorno alla mia mano destra…
Lui mi aveva sempre battuto nella lotta
ma il dubbio lo aveva indebolito,
lavorato ai fianchi come una marea.
Quando è precipitato ho fatto in tempo a vedere i suoi occhi infuocarsi.
Credo che nel mondo questo si chiami piangere.
Un verbo che ho imparato da lui.
In segreto studiava le parole degli uomini
e i loro movimenti mancini.
Aveva sete di tutto.
Aveva invidia della terra.
Mentre cadeva sotto la geometria aguzza dei colpi
mi è sembrato che sorridesse.
O forse preferisco crederlo.
Dico che non avrei voluto questo compito.
Ho fatto io, quell’angolo vuoto accanto al Padre.
Da allora la mia mano impugna in ogni gesto un’arma.
E tengo l’amico sotto i miei piedi.
Miguel
Tenho debaixo dos pés o sangue do meu amigo.
Sua mordida no fio da minha lança.
Éramos vizinhos, partilhávamos sonhos,
usávamos os mesmos emblemas na couraça.
As suas asas eram maiores do que as minhas,
cobriam melhor as distâncias.
Mais rápido na corrida e no riso,
mais hábil em prevenir os desejos do pai.
Ele olhava- nos sorrindo, como se desfrutasse de nossa semelhança.
Mas seu rosto era mais bonito que o meu.
Menos manchado pelas imprecisões.
Dizia-me muitas vezes que o gozo absoluto da eternidade o assustava.
Falava devagar como se o pai não o pudesse ouvir.
Eu via que este pensamento lhe mudava as mãos,
lhe escurecia a pele.
Tenho manchas de sangue nas dobras limpas da túnica.
Uma faixa de terra atada à cintura.
Uma coroa de espinhos ao redor da minha mão direita...
Sempre me levou a melhor na luta
mas a dúvida tinha-o debilitado,
erodindo-lhe os quadris como uma maré.
Quando caiu, tive tempo para ver os seus olhos a arder.
Acho que no mundo a isso se chama chorar.
Um verbo que aprendi com ele.
Em segredo estudava as palavras dos homens,
e os seus movimentos falsos.
Tinha sede de tudo.
Tinha inveja da terra.
Enquanto caía sob a simetria aguda dos golpes
Pareceu-me que estava a sorrir.
Ou assim quero crer.
Confesso que teria preferido não cumprir esta missão.
Fui eu quem deixou esse vazio no Pai.
Desde então minha mão empunha em cada gesto uma arma.
E tenho o meu amigo debaixo dos pés.