The Octagonal
Tower
‘History
is the love that enters us through death; its discipline is grief.’
Anne
Michaels
I
Whatever rage has
come through these sealed doors,
and scalded us black
and frayed, we have no name for.
We cannot explain
the quiet, sleepless shift of whispers,
a procession of
shrouds along our corridors,
or the diverted eyes
that cloud to see a row of winter oaks outside
shocked in their
dendritic fizz. And if we do know it,
it is in the blood,
in this terrible synapse of sky, in the road away.
From our house we
drive down through a sunken valley
where, like a crypt,
it is forever the hour of the dead.
You have always worn
the wheel, pushed your hands and wrists
through its axes, as
though it were a shackle. Driven, hunched.
It is the same—the
sting of yucca and eucalyptus, a vein of pink
bougainvillea purged
in hot pulses off rooftops—a fragrant massacre—
and the same steady
road you drive every time afraid to speak,
afraid to ask when I
will leave you alone in that house with your wife.
I translate your
favourite song in my mind: This song of mine, no one will sing.
This song of mine
that I sing myself will die tomorrow with me.
An October night,
1975. A sudden rain has liquefied the earth.
Mud isn’t enough.
There is a word you use that means more than mud,
it is the sound of a
foot, sunken to the ankle, pulling itself out—
the awful suck of
uprooting. Like a scream, it is the fear of standing
so long that you
might stay and sink forever. This sound trails
behind you and your
brother as you walk the fields one last time.
You will leave and
not return for ten years, to marry my mother
who you’ve not yet
met. Your four bare feet make an agreement
with the earth, to
remember. It prints its own response in your shadows.
II
Holidays are
uncertain times. The marble face of an old king’s grief
deflects the
spectacle of his queen’s death in each perfect tessera.
The Taj rises above
the Jammuna, doubles paradise in the mastery of slaves.
Holidays are
uncertain times; their hands are cut off arms thrown up
in celebration. Now
they too mourn, and skyward pray to phantom limbs
in the gardens of
heaven, alone to pluck and preen.
They are carted away
without ceremony, along with the remains of stone
that, like teeth,
fall out of swooning heads. The funeral begins.
Mumtaz, hollow as a
bride, is veiled in by her white, carved lid.
No one knows when
you were born. They think it was an autumn month.
At five you asked
where your mother was. Your soot lashes pooled with fear.
Gone to your
grandmother’s. Later you found her picture—
a woman propped up,
freshly dead, her hands emptied of the past.
And you, seated on
her lap, two years old, holding her
and what held her
forever in that exposure.
III
The road widens past
tracts of arched houses; you drive faster and grip the wheel.
I say I won’t
leave till after the New Year, but by now it doesn’t matter.
Your knuckles are
bloodless, and your stoic eyes are the calm surface of a timepiece.
Shah Jehan,
imprisoned in a tower by his son, was sent a gold platter
the day of the coup
with the head of his chosen heir upon it.
Seeing this the old
king fell, knocked the teeth out of his head.
For eight years he
watched the Taj from his window, from across the river,
in a diamond mounted
in the wall that reflected it a million times over.
The soft marble
hands of his wife extended to him, to the empty casket beside her.
When the river
filled, he walked across it.
When the door opens,
only one of us leaves. I watch your car until it is far down
through the shadows
of trees. The road receives you, and the house receives you,
as does the galley
of water, the trimmed hedge, the cold, sterile cell.
In your wallet, you
carry a picture of my mother, from before my birth,
when she was only
yours. Her pinks match the pinks of flowers;
she bows her head
into the branch and smiles, as beautiful as a queen.
Love is incidental,
time-bound. It is the memory of love we love.
It is the memory
that fattens on pain—of these small deaths
and these stone
walls. The crown that has sunken from your ears
and hangs around
your neck is all that remains.
A
torre octogonal
“A
história é o amor que nos entra através da morte; a sua disciplina
é a dor.”
-Anne
Michaels
I
Seja
qual for a raiva que atravessou estas portas lacradas
e
nos tenha escaldado em tição e nos tenha tornado pedaços, não
temos nome para isso,
Não
conseguimos explicar a silente e insone troca de sussurros,
uma
procissão de mortalhas ao longo dos nossos corredores,
ou
os olhos divergentes que se enevoam para ver uma fileira de carvalhos
invernais lá fora
gelados
na sua dendrítica efervescência. E se sabemos isso,
é
no sangue, nessa terrível sinapse de céu, no caminho que se afasta.
Da
nossa casa conduzimos através de um vale afundado
onde,
como numa cripta, é sempre a hora da morte.
Sempre
usaste a roda, empurrando as tuas mãos e pulsos
através
dos seus eixo como se fosse uma grilheta. Impelido, encurvado,
É o
mesmo – a picada da mandioca e do eucalipto, uma veia rósea
buganvilia
purgada em pulsos quentes dos telhados – um fragrante massacre–
e o
mesmo caminho firme por onde conduzes sempre que tens medo de falar,
medo
de perguntar quando te deixarei sozinho nessa casa com a tua esposa.
Traduzo
a tua canção preferida na minha cabeça : esta canção minha que
ninguém cantará.
Esta
canção minha que eu canto sozinha morrerá amanhã comigo.
Uma
noite de outubro, 1975. Uma chuva repentina tornou líquida a terra.
Lama
não é suficiente. Há uma palavra que usas que significa mais que
lama,
é o
som de um pé, afundado até ao tornozelo, saindo por si mesmo -
o
som horrível do desenraizamento. Como um grito, é o medo a deter-se
tanto
tempo que podias ficar aí e afundares-te para sempre. Este som
arrasta-se
atrás
de ti e do teu irmão enquanto caminhas pelos campos pela última
vez.
Partirás
e não regressarás durante dez anos para te casares com a minha mãe
a
quem ainda não conheci. Os teus quatro pés descalços fazem um
acordo
com
a terra, para recordar. Imprime a sua própria resposta nas tuas
sombras.
II
As
férias são tempos incertos. A face marmórea da dor de um velho rei
desvia
o espetáculo da morte da sua rainha em cada azulejo perfeito.
O
Taj eleva-se sobre o Jammuna, um paraíso desdobrado na mestria dos
escravos.
As
férias são tempos incertos ; as suas mãos são braços cortados
que se levantam
em
celebração. Agora eles também choram e em direção ao céu rezam
pelos membros-fantasma
nos
jardins do céu, só para arrancar e limpar.
São
levados para lá sem qualquer cerimónia, junto com os restos de
pedra
que,
como dentes, caem das desvanecidas cabeças. O funeral começa.
Mumtaz,
oca como uma noiva, está velada pela sua coberta talhada e branca.
Ninguém
sabe quando nasceste. Acham que foi num mês de outono.
Com
cinco anos perguntaste onde estava a tua mãe. As tuas abas de
ferrugem juntas pelo medo.
Tinha
ido com a tua avó. Mais tarde encontraste o seu retrato -
una
mulher escorada, recém-morta, com as mãos esvaziadas do passado.
E
tu, sentada no seu regaço, dois anos de idade, sustendo-a
e o
que a manteve para sempre nessa exposição.
III
O
caminho alarga-se a seguir às casas arqueadas ; conduzes mais
depressa e aferras-te ao volante.
Digo
que não partirei antes da passagem do Ano Nono, mas por agora não
interessa.
As
tuas articulações não têm sangue e os teus olhos estóicos são a
superfície tranquila de um relógio.
Shah
Jehan, encarcerado numa torre pelo seu filho, recebeu uma bandeja de
ouro
no
dia da cabeçada do herdeiro que nela tinha sido escolhido
Ao
ver isto, o velho rei caiu, arrancou os dentes da cabeça.
Durante
oito anos viu Taj da sua janela, do outro lado do rio.
num
diamante montado na parede que o refletia um milhão de vexes.
As
suaves mãos de mármore da sua esposa estendiam-se para ele, para o
ataúde vazio ao seu lado.
Quando
o rio se encheu, ele atravessou-o caminhando.
Quando
a porta se abre, só um de nós parte. Fico a olhar para o teu carro
até estar muito longe
através
das sombras das árvores. O caminho recebe-te, e a casa recebe-te,
tal
como esse corpo de água, as sebes podadas, a fria e estéril cela.
Na
tua carteira trazes uma fotografia da minha mãe, anterior ao meu
nascimento.
Quando
ela era só tua. As suas rosas coincidem com o rosa das flores;
ela
inclina a sua cabeça para os galhos e sorri, bela como uma rainha.
O
amor é incidental, limitado ao tempo. O que amamos é a lembrança
do amor.
É a
memória que alastra pela dor – desta pequenas mortes
e
estes muros de pedra. A coroa que se afundou dos teus ouvidos
e se
pendura à volta do teu pescoço, é tudo o que fica.