18 janeiro 2019

dorothea laskey

The miscarriage

The doctor says it’s an empty room in there

And it is

A pale sack with no visitors
I have made it and surrounded it with my skin
To invite the baby in

But he did not enter
And dissolved himself into the sea so many moons ago

I wait to see
Will the giant bean be in there another day

The women of the world say
Work harder!

The men in the world say
Work harder!

I work and work but I am an empty sack
Until I bleed the food all over the floor

Then I am once again with everything
Until the gods say, you’ve done well, good sir
You may die now

And the people who were asking me for favors all along
Knock on the coffin door
But I am gone, gone

O aborto

O médico disse que é um quarto vazio

E é.

Um pálido saco sem visitantes
Filo e envolvi-o com a minha pele
Para convidar o bebé a entrar

Mas ele não entrou
e dissolveu-se a si mesmo no mar há muitas luas atrás

Esperei para ver
O feijão gigante aparecerá outro dia

As mulheres do mundo dizem
Trabalha duro!

Os homens do mundo dizem
Trabalha duro!

Trabalho e trabalho mas estou um saco vazio
até sangrar a comida pelo chão todo

Aí estou mais uma vez com tudo
Até os deuses dizerem, fizeste bem, caro colega,
Agora já podes morrer

E as pessoas que me pediram favores toda a vida
Bateram à porta do caixão
Mas eu tinha ido, ido.





15 janeiro 2019

judith rico


Pies Descalzos
A mi madre

Ella,
siempre me dice
que adora sus zapatos nuevos,
pero casi nunca se los pone,
no camina cómoda
como lo solía hacer antes.
Yo,
siempre respondo
que no hace falta que se ponga tacones,
no se da cuenta
que con sus pies descalzos,
siempre camina más alto
que el resto de la humanidad.

Pés Descalços
A minha mãe

Ela,
sempre me disse
que adora os seus sapatos novos,
mas quase nunca os calça,
não anda cómoda
como costumava fazer antes.
Eu,
sempre respondo
que não é preciso que ande de tacões,
não se dá conta
que com seus pés descalços,
sempre caminha mais alto
que o resto da humanidade.


12 janeiro 2019

marta braier


Mujer sentada

Pero sé que debo hablar de esa puerta,
en un hotel para turistas de la calle Cangallo.

Recuerdo con nitidez un finísimo rayo de sol
y las partículas del aire jugando con la luz.
( Ah el sencillo fulgor de una habitación en penumbras).

Estoy sentada sobre un sucio cobertor.

El conserje me entregó la llave de la diecinueve
y miró con cara de nada
cuando le hablé de tiempo de sosiego.

Cerró la puerta y me dejó queriendo comprender.

(Los mosaicos hacían muecas con su geometría).

Poco importa si por la calle pasa un hombre,
si hay una fábrica, un frigorífico, o muchos árboles.
Pero, el aire. ¿Entra por los pulmones, sale o permanece?

¿Qué hago, qué hago aquí,
en un cuadrado sórdido y ajeno?
Ajeno. Sórdido. Agujero del mundo, digo.

Sentada sobre un sucio cobertor. De Gestos de minué

Mulher sentada

Mas sei que tenho de falar dessa porta,
num hotel para turistas da Rua Cangallo.

Lembro com nitidez um finíssimo raio de sol
e as partículas do ar brincando com a luz.
( Ah o singelo fulgor de um quarto em penumbra).

Estou sentada sobre um sujo cobertor.

O porteiro entregou-me a chave do dezanove
e olhou com cara fechada
quando lhe falei de tempo de sossego.

Fechou a porta e deixou-me querendo compreender.

(Os mosaicos faziam caretas com a sua geometria).

Pouco importa se pela rua anda um homem,
se há uma fábrica, um frigorífico, ou muitas árvores.
Mas, o ar. Entra pelos pulmões, sai ou permanece?

Que faço, que faço aqui,
num quadrado sórdido e alheio?
Alheio. Sórdido. Buraco do mundo, digo.

Sentada sobre um sujo cobertor. De Gestos de minuete

09 janeiro 2019

elena barrio



mi corazón no me basta.
en la noche siento que mi corazón,
atrofiado congénitamente, no me basta.

mi corazón es pequeño, una habitación de hostal sin aseo,
de paredes angulares, estucadas, viejas. siento que las vibraciones
ponen en peligro la estructura de la fachada. siento que las vibraciones
comprometen la integridad del edificio. siento que las palpitaciones
se perdieron en un latir acuático, lánguido, inútil.

mi corazón es pequeño pero el temblor es inmenso,
y me lleva como una ola silenciosa, de esas que contienen un peligro
animal, intuitivo.

mi corazón no me basta y ya sólo me queda
escupir la bilis, escupir los ganglios
que constriñen mi cuello
cada día.

o coração não me basta.
pela noite sinto que o meu coração,
atrofiado congenitamente, não me basta.

o meu coração é pequeno, um quarto de pensão sem higiene,
de paredes angulosas, estucadas, velhas, sinto que as vibrações
põem em perigo a estrutura da fachada, sinto que as vibrações
comprometem a integridade do edifício. sinto que as palpitações
se perderam num latir aquático, lânguido, inútil.

o meu coração é pequeno mas o tremor és imenso,
leva-me como onda silenciosa, das que contêm um perigo
animal, intuitivo.

o coração não me basta e já só me resta
cuspir a bílis, cuspir os gânglios
que constrangem o meu pescoço
todos os dias.

06 janeiro 2019

isla correyero


Trío

Propuso un trío al festejar su vuelta.
Puse de lujo vasos y vajilla,
rosas y lirios en la mesa grande,
blanco mantel de acanalados pájaros.

Llegó preciosa cuando vino el otro,
los dos entraron juntos en la casa,
uno inflamó las velas y visillos,
la otra llenó mi copa de ginebra.

Bebimos sin comer, los tres a un tiempo,
la mesa se cubrió de fuego y hojas,
mi amada me ofreció su pan mojado,
y yo comí de él. El pan sangraba.

El afecto nos hizo inseparables.

Trio

Propus um trio para festejar o seu regresso.
Utilizei copos e serviços de luxo
rosas e lírios na mesa grande,
Toalha branca com canelados de pássaros.

Ficou linda quando veio o outro
os dois entraram juntos na casa,
um acendeu as velas e cortinas,
a outra encheu o meu copo de genebra.

Bebemos sem comer, os três ao mesmo tempo,
a mesa cobriu-se de fogo e de folhas,
a minha amada ofereceu-me o seu pão molhado
do qual comi. O pão sangrava.

O afeto tornou-nos inseparáveis.

03 janeiro 2019

merari lugo ocaña


El líquido amniótico aún fresco
impregna la sala de los llantos.
La nulidad en sus pulmones
cuelga de un respirador.
La minúscula mano se aferra
a una simple cánula de plástico.
Esta muerte es la única noche
de un recién nacido pretérmino,
su madre cansada le acaricia el pecho
para que se hunda aún más.

O líquido amniótico ainda fresco
impregna a sala dos gritos.
A nulidade em seus pulmões
está pendurada num ventilador.
A minúscula mão agarra-se
a uma mera cânula de plástico.
Esta morte é a única noite
de um recém-nascido prematuro,
a sua mãe cansada acaricia-lhe o peito
para que se afunde ainda mais.

31 dezembro 2018

olalla castro


Era tan grande aquella sed de blanco.
Ansiábamos el hielo y sus destellos,
el deslumbre punzante de la escarcha.
Bajo su resplandor, fundar el mundo.
Soñábamos con ir siempre más lejos,
con ser los primeros en pisar esa nieve.
Una luz oblicua alargó nuestras sombras
y extraviamos la escala.
Nos creímos gigantes.
Corrimos hacia el brillo
de la única forma en que sabemos
correr hacia las cosas:
con una red pequeña entre las manos
y un arpón escondido en la garganta.
Agarramos el hielo con nuestras manos tibias.
Lo agarramos
hasta que todo lo que brillaba se deshizo.

Era muito grande essa sede de branco.
Ansiávamos o gelo e seus clarões,
o deslumbre pungente da geada.
Sob o seu esplendor, fundar o mundo.
Sonhávamos ir sempre mais longe,
ser os primeiros a pisar essa neve.
Uma luz oblíqua alargou as nossas sombras
e extraviamos a escala.
Acreditámos ser gigantes.
Corremos para o brilho
da única maneira que sabemos
correr até às coisas :
com uma rede pequena entre as mãos
e um arpão escondido na garganta.
Agarramos o gelo com as nossas mãos tíbias.
Agarrámo-lo
até que tudo o que brilhava se desfazer.


28 dezembro 2018

alejandra correa



Hoy vi la casa desde otra perspectiva

“elevada”, diríamos

Una casa en el aire
sostenida por un árbol viejo
atada a las raíces de otra casa
que hendía sus garras en la tierra seca

Afuera hubo cosechas
el campo es un tendaderal
de mieses rotas
una tela inscripta por tocones
de maíces desperdigados
como letras chinas

La casa se multiplica por mis venas
al infinito
miles de ojos de mosca al cuadrado
ventanas y puertas y pasillos y techos
se incendian

Si algo no ha de pasar
entonces pasará, decías
y en un abrir y cerrar de boca
con los restos de un huracán
levantamos una ciudad maldita

Vamos hacia alguna parte siempre
y llevamos esta carga
como si fuera tan fácil sonreir

Inflada por tu miedo y el mío
la casa se hace globo
sus paredes ceden, elásticas

respira con el aire que nos quita

Dentro de sueños que son armas químicas
la casa aún nos duele
como un brazo amputado

Te llamo
gesticulo exageradamente
como quien quedó atrapado
en una película muda


Hoje vi a casa noutra perspectiva

elevada”, diríamos

Uma casa no ar
sustida por uma velha árvore
atada às raízes de outra casa
que fendia as suas garras na terra seca

Lá fora houve colheitas
o campo é um estendal
de searas quebradas
uma tela inscrita por cepos
de milhos espalhados
como letras chinesas

A casa multiplica-se pelas minhas veias
ao infinito
milhares de olhos de mosca ao quadrado
janelas e portas e corredores e tectos
incendeiam-se

Se não se passar nada
então passará, dizias
e num abrir e fechar de boca
com os restos de um furacão
levantamos uma cidade maldita

Vamos sempre até algum lado
e levamos esta carga
como se fosse muito fácil sorrir

Inflada pelo teu medo e o meu
a casa faz-se globo
as suas paredes cedem, elásticas

respira com o ar que nos tira

Dentro de sonhos que são armas químicas
a casa ainda nos dói
como um braço amputado

Chamo-te
gesticulo exageradamente
como quem ficou apanhado
num filme mudo


25 dezembro 2018

violeta barrientos



En una playa lejana las sirvientas son puntos blancos, las disfrazan de gaviotas. Sólo se acercan a la orilla cuando atardece y no queda nadie en la arena. Cuando todos se han ido y nadie puede verlas.

Desnudas se bañan entre las olas, nadie pensaría en sus cuerpos cuando siempre van de blanco, unas y otras en un solo cuerpo común. Son lobos marinos asomando cabezas sobre el agua, aleteando hacia un mundo de juegos donde aúllan en revuelo.

Por fin el mar ha desatado la energía suspendida de un mandil.

Numa praia longínqua as criadas são pontos brancos, disfarçam-nas de gaivotas. Só se aproximam da orla quando entardece e não há ninguém na areia. Quando todos partiram e ninguém as pode ver.

Nuas, banham-se nas ondas, ninguém pensaria nos seus corpos quando estão sempre de branco, umas e outras num único corpo comum. São lobos marinhos pondo as cabeças fora de água, movendo as asas até a um mundo de jogos onde uivam em agitação.

Por fim o mar desamarrou a energia suspensa de um avental.

22 dezembro 2018

ángela figuera aymerich


Culpa

Si un niño agoniza, poco a poco, en silencio,
con el vientre abombado y la cara de greda.
Si un bello adolescente se suicida una noche
tan sólo porque el alma le pesa demasiado.
Si una madre maldice soplando las cenizas.
Si un soldado cansado se orina en una iglesia
a los pies de una Virgen degollada, sin Hijo.
Si un sabio halla la fórmula que aniquile de un golpe
dos millones de hombres del color elegido.

Si las hembras rehuyen el parir. Si los viejos
a hurtadillas codician a los guapos muchachos.
Si los lobos consiguen mantenerse robustos
consumiendo la sangre que la tierra no empapa.

Si la cárcel, si el miedo, si la tisis, si el hambre.
Es terrible, terrible. Pero yo, ¿qué he de hacerle?
Yo no tengo la culpa. Ni tú, amigo, tampoco.
Somos gente honrada. Hasta vamos a misa.
Trabajamos. Dormimos. Y así vamos tirando.
Además, ya es sabido. Dios dispone las cosas.

Y nos vamos al cine. O a tomar un tranvía.

Culpa

Se uma criança agoniza, pouco a pouco, em silêncio,
com o ventre convexo e cara de barro.
Se um belo adolescente se suicida à noite
apenas porque a alma lhe pesa demasiado.
Se uma mãe lança pragas soprando as cinza,
Se um soldado cansado mija numa igreja
aos pés de uma Virgem degolada, sem Filho.
Se um sábio encontra a fórmula para aniquilar de uma só vez
dois milhões de homens da cor escolhida.

Se as fêmeas recusam parir. Se os velhos
secretamente cobiçam os bonitos rapazes.
Se os lobos se conseguem manter robustos
consumindo o sangue que a terra não empapa.

Se o cárcere, se o medo, se a tísica, se a fome.
É terrível, terrível. Porém eu que poso fazer?
Não tenho culpa. Nem tu amigo, claro,
Somos gente honrada. Até vamos à missa.
Trabalhamos. Dormimos. Assim vamos estando.
Além disso, já se sabe. Deus dispõe as coisas.

E vamos ao cinema. Ou apanhar um eléctrico.


19 dezembro 2018

victoria mallorga

ix.

así se sienten los mártires cuando besan la cruz de tu frente:
abril del 98, botellas y botellas de vino local, la fragancia de la sangre fresca, el olor de amapolas endulzadas en menta, cortinas rasgadas, terremotos en ciudades de densidad poblacional elevada.

así se sienten los mártires cuando cometen un acto de fe:
mayo del 98, el olor de sangre vieja, las tizas de sal, la tierra fresca, votos de alianza incumplidos, rodillas húmedas y llenas de fe. fe de montañas, fe de hermanos, fe de enfermedad y cura, fe de vida.

si los objetos pudieran evocar
lo diría hoy
entre dientes y a la broma, como una promesa de la alianza
si las campanas fueran más que hierro vacío,
nos dirían que

así se sienten los mártires tres años después de un acto de fe:
silencio. paz. Azufre.

ix.

assim se sentem os mártires quando beijam a cruz da tua testa:
abril de 98, garrafas e garrafas de vinho local, a fragrância do sangue fresco, o odor das papoilas
adoçadas em menta, cortinas rasgadas, terramotos em cidades de densidade populacional elevada.

assim se sentem os mártires quando cometem um ato de fé:
maio de 98, o cheiro a sangue velho, giz de sal, terra fresca, votos de união incumpridos,
joelhos húmidos e cheios de fé, fé de montanhas, fé de irmãos, fé de doença e cura, fé de vida.

se os objetos pudessem evocar
diria hoje
entre dentes e brincadeira, como promessa de uma aliança
se os sinos fossem mais que ferro vazio,
dir-nos-iam que

assim se sentem os mártires três anos depois de um ato de fé:
silêncio, paz. Enxofre.



16 dezembro 2018

silvina giaganti


Las mujeres que me volvieron loca de verdad

Las mujeres que más amé
las que me volvieron loca de verdad
las chicas con las que quise todo, escribían.

Mi mamá hizo hasta segundo grado y no
me miró los cuadernos ni pudo
colorear un mapa conmigo o ayudarme
en un ejercicio de contabilidad.

El colegio y casa eran
una cadena rota en mi cabeza.
Cada vez que la veía firmar algo,
el boletín de la primaria,
un documento en el banco,
notaba que lo hacía lentamente
como alguien recuperándose de un golpe.

Me pregunto si las mujeres que amé
las que me volvieron loca de verdad
las chicas con las que quise todo
fueron mi movilidad intelectual ascendente,

si elegir mujeres que escriben
es disimular eso que me falta
cada vez que las dejo
o que me dejan.

As mulheres que me tornaram realmente louca

As mulheres que mais amei
as que me tornaram realmente louca
as raparigas com quem quis ter tudo, escreviam.

A minha mãe estudou até à segunda classe e não
viu os meus cadernos nem pôde
colorir um mapa comigo ou ajudar-me
nos exercícios de contabilidade.

A escola e a casa eram
uma cadeia partida na minha cabeça.
Sempre que a via assinar alguma coisa,
o boletim da primária
um documento em branco,
reparava que o fazia lentamente
como alguém que recuperasse de um golpe.

Pergunto-me se as mulheres que amei
as que me tornaram realmente louca
as raparigas com quem quis ter tudo
foram a minha mobilidade intelectual ascendente,

se escolher mulheres que escrevem
é dissimular isso que me falta
cada vez que as deixo
ou que me deixam.