Madre,
sueño con mi cadáver todas las noches.
De mi vientre cuelgan dos seres que no quisieron nacer.
He renunciado a todo lo que me hacía infeliz.
He renunciado a todo.
He renunciado.
Solo hasta que te arrancan a dos manos el esternón
abres los párpados
y barres las costras secas
que tapizan el piso de tu cuarto.
Solo hasta que alguien mete su mano en tu ombligo
y extrae una víscera sangrante
que late caliente al aire
conviertes en arcilla la casa
y la intentas moldear
o la aplastas de una vez.
Madre,
tengo veinte y tres años
y parece un siglo.
Sueño con mi cuerpo tieso
todos los días.
He renunciado a tanto y
¿por qué
estas ganas de llorar?
¿Por qué las heridas
suturadas se abren y sangran otra vez?
¿Por qué el silencio
que diseca mis huesos?
¿Por qué la puerta sigue cerrada
frente a mi rostro?
He renunciado a mí.
He renunciado.
Me abandoné cada tarde.
Yuliana espera por mí
en alguna estación lejana.
Impaciente;
se come las uñas,
los dedos.
Yuliana se come.
Madre,
sigo hablando de mí
a la gente
como si esto importara.
Como si la manta se levantara
y me dijeran
que deje de llorar
que todo fue una broma de mal gusto,
que ahora puedo reírme
a carcajadas de mí
y de mi vientre.
Que todo ha sido una broma
de muy mal gusto.
Que esto no soy yo
que afuera de la manta
hay vida en serio.
Madre
he renunciado a todo lo que me hacía infeliz.
¿por qué la muralla sigue creciendo?
Madre,
no debí salir de tu vientre.
Mira mis huesos.
Mira su fragilidad.
Mira los días
que se posan lilas
bajo mis ojos.
Mira mis manos
transparentes.
La muralla tiene vida.
A mi alrededor todo exhala más vida que yo.
Mãe,
sonho com o meu cadáver todas as noites.
Do meu ventre pendem dois seres que não quiseram nascer.
Renunciei a tudo o que me fazia infeliz.
Renunciei a tudo.
Renunciei.
Só até o esterno por duas mãos ser arrancado
abres as pálpebras
e varres as crostas secas
que atapetam o chão do teu quarto.
Só até que alguém meta a sua mão no teu umbigo
e extraia uma víscera a sangrar
que lateja quente ao ar
convertes em argila a casa
e tentas moldá-la
ou esmagá-la de uma vez.
Mãe,
tenho vinte e três anos
e parece um século.
Sonho com meu corpo rígido
todos os dias.
Renunciei a tanto e
por quê
estas compulsões de chorar?
Porque é que as feridas
suturadas se abrem e sangram outra vez?
Porquê o silêncio
que disseca os meus ossos?
Porque é que a porta continua fechada
diante do meu rosto?
Renunciei a mim.
Renunciei.
Abandonei-me todas as tardes.
Yuliana espera por mim
nalguma estação longínqua.
Impaciente;
Rói as unhas,
os dedos.
Yuliana come-se.
Mãe,
continuo a falar de mim
às pessoas
como se isso importasse.
Como se a manta se levantasse
e me dissessem
para deixar de chorar
que tudo foi uma brincadeira de mau gosto,
que agora posso rir-me
às gargalhadas de mim
e do meu ventre.
Que tudo foi uma brincadeira
de muito mau gosto.
Que isto não sou eu
que fora da manta
há vida de verdade.
Mãe,
não devia ter saído do teu ventre.
Olha para os meus ossos.
Vê a sua fragilidade.
Vê os dias
que se hospedam em lilás
debaixo dos meus olhos.
Olha para as minhas mãos
transparentes.
A muralha tem vida.
Ao meu redor tudo exala mais vida do que eu.