06 outubro 2021

yuliana ortiz ruano


Madre,

sueño con mi cadáver todas las noches.

De mi vientre cuelgan dos seres que no quisieron nacer.

He renunciado a todo lo que me hacía infeliz.

He renunciado a todo.

He renunciado.

Solo hasta que te arrancan a dos manos el esternón

abres los párpados

y barres las costras secas

que tapizan el piso de tu cuarto.

Solo hasta que alguien mete su mano en tu ombligo

y extrae una víscera sangrante

que late caliente al aire

conviertes en arcilla la casa

y la intentas moldear

o la aplastas de una vez.

Madre,

tengo veinte y tres años

y parece un siglo.


Sueño con mi cuerpo tieso

todos los días.

He renunciado a tanto y

¿por qué

estas ganas de llorar?

¿Por qué las heridas

suturadas se abren y sangran otra vez?

¿Por qué el silencio

que diseca mis huesos?

¿Por qué la puerta sigue cerrada

frente a mi rostro?

He renunciado a mí.

He renunciado.

Me abandoné cada tarde.

Yuliana espera por mí

en alguna estación lejana.

Impaciente;

se come las uñas,

los dedos.

Yuliana se come.


Madre,

sigo hablando de mí

a la gente

como si esto importara.

Como si la manta se levantara

y me dijeran

que deje de llorar

que todo fue una broma de mal gusto,

que ahora puedo reírme

a carcajadas de mí

y de mi vientre.


Que todo ha sido una broma

de muy mal gusto.

Que esto no soy yo

que afuera de la manta

hay vida en serio.

Madre

he renunciado a todo lo que me hacía infeliz.

¿por qué la muralla sigue creciendo?

Madre,

no debí salir de tu vientre.

Mira mis huesos.

Mira su fragilidad.

Mira los días

que se posan lilas

bajo mis ojos.

Mira mis manos

transparentes.

La muralla tiene vida.

A mi alrededor todo exhala más vida que yo.



Mãe,

sonho com o meu cadáver todas as noites.

Do meu ventre pendem dois seres que não quiseram nascer.

Renunciei a tudo o que me fazia infeliz.

Renunciei a tudo.

Renunciei.

Só até o esterno por duas mãos ser arrancado

abres as pálpebras

e varres as crostas secas

que atapetam o chão do teu quarto.

Só até que alguém meta a sua mão no teu umbigo

e extraia uma víscera a sangrar

que lateja quente ao ar

convertes em argila a casa

e tentas moldá-la

ou esmagá-la de uma vez.

Mãe,

tenho vinte e três anos

e parece um século.


Sonho com meu corpo rígido

todos os dias.

Renunciei a tanto e

por quê

estas compulsões de chorar?

Porque é que as feridas

suturadas se abrem e sangram outra vez?

Porquê o silêncio

que disseca os meus ossos?

Porque é que a porta continua fechada

diante do meu rosto?

Renunciei a mim.

Renunciei.

Abandonei-me todas as tardes.

Yuliana espera por mim

nalguma estação longínqua.

Impaciente;

Rói as unhas,

os dedos.

Yuliana come-se.


Mãe,

continuo a falar de mim

às pessoas

como se isso importasse.

Como se a manta se levantasse

e me dissessem

para deixar de chorar

que tudo foi uma brincadeira de mau gosto,

que agora posso rir-me

às gargalhadas de mim

e do meu ventre.


Que tudo foi uma brincadeira

de muito mau gosto.

Que isto não sou eu

que fora da manta

há vida de verdade.

Mãe,

não devia ter saído do teu ventre.

Olha para os meus ossos.

Vê a sua fragilidade.

Vê os dias

que se hospedam em lilás

debaixo dos meus olhos.

Olha para as minhas mãos

transparentes.

A muralha tem vida.

Ao meu redor tudo exala mais vida do que eu.